CRÔNICAS

Paulinho Kokay: ao vencedor, as batatas

Em: 04 de Maio de 1993 Visualizações: 2837
Paulinho Kokay: ao vencedor, as batatas

.Quando o compositor e cantor Paulinho Kokay chegou à pequena estação rodoviária da cidadezinha mineira de Passa-Quatro, naquela manhã do dia 25 de abril, fazia um friozinho danado de outono. Kokay teve a impressão de que ele e o ultrafamoso repórter Mauro Roberto, que o acompanhava, eram provavelmente os dois primeiros amazonenses a colocarem os pés ali. A impressão logo se transformou em certeza:

- Eles chegaram!!! Os amazonenses chegaram!!! – gritava assim, com seis pontos de exclamação, um dos integrantes do Comitê de Recepção, que parecia um personagem de uma novela rural da Rede Globo. Se a Jacutinga e o coronel Inocêncio aparecessem ali, ninguém se surpreenderia.

Tivesse o fato ocorrido no início do século XVIII, Kokay seria considerado um “emboaba”, um forasteiro. Daria guerra. Mas como aconteceu na semana passada, deu viola e canto, porque os dois forasteiros chegavam para o Festival Internacional de Música de Passa-Quatro, com 34 inscritos, dos quais 30 eram mineiros, um paulista, um carioca e o amazonense Kokay. Todos foram recebidos com muita festa, numa demonstração da hospitalidade passa-quatrense.

Passa-Quatro

Estância hidromineral encravada no coração da Serra da Mantiqueira (MG), a 20 km da fronteira de São Paulo, a mineira Passa-Quatro, com 15.000 moradores, às vezes é confundida com a paulista Santa Rita do Passa-Quatro. Sua principal atividade econômica é a produção de batata, cultura típica das áreas mais elevadas, onde a temperatura média é relativamente baixa.

- Toda a região de Poço de Caldas da qual faz parte Passa-Quatro– me ensina o repórter Mauro Roberto - é responsável por um terço da produção de batatas de Minas. Mas nem só de batata vive o município. A Prefeitura, depois de vinte anos de inatividade, decidiu reeditar o tradicional festival intitulado “Canto de Minas” para concorrer com o “Festival Zequinha de Abreu” que leva o nome do autor de Tico-Tico no Fubá nascido em Santa Rita. Um palco foi armado na praça central da cidade, para onde converge mais da metade da população da cidadezinha.  

Kokay concorreu com a música de sua autoria intitulada “Bailarina” por ele cantada todos os fins de semana naquele bar lá pras bandas do bairro  D.Pedro, em Manaus, que tem um nome sugestivo: UTI. Ele subiu ao palco e lavou a égua. Quando terminou, o repórter Mauro Roberto distribuiu a letra impressa da música, acompanhada de um autógrafo do autor. As pessoas fizeram fila. A “Bailarina” foi classificada entre as dez finalistas que disputariam no dia seguinte o primeiro lugar.

No domingo, a disputa foi acirradíssima. O público decidiu antes do júri, aplaudindo e cantando a música do Kokay, que ganhou o primeiro lugar e abiscoitou dois troféus: melhor intérprete e melhor música. O segundo lugar ficou com “Flor da Paixão” de Klaus Maciel e “Disfarce” de Blaun. Há quem diga, mesmo reconhecendo a qualidade da “Bailarina” e de seu autor, que parte da vitória se deve a estratégia marqueteira de Mauro Roberto. O certo é que depois de Célio Cruz, em Santa Catarina, Kokay “é mais um amazonense que vence lá fora”.

As batatas

Por que a cidade é denominada de Passa-Quatro e não de Passa-Cinco? Mistério. Mauro Roberto não conseguiu apurar.

Passa-Quatro podia muito bem ter um vereador chamado Elpídio Magalhães eleito pelo PMDB, nascido em Barbacena. Elpídio poderia muito bem ter feito um projeto para premiar o vencedor do Festival com um caminhão cheio de batatas. Se fosse aprovado, Paulinho Kokay poderia alimentar o público do bar UTI com batatas fritas durante um semestre.

Elpídio justificaria seu projeto, argumentando que o caminhão de batatas, além de valorizar o produto local e projetar para fora as qualidades da batata passa-quatrense, tem suas raízes literárias:

“Rubião, logo que chegou a Barbacena e começou a subir a rua que ora se chama Tiradentes, exclamou parando:

- Ao vencedor, as batatas”.

Desta forma, Machado de Assis começa o capítulo CXCV do seu romance Quincas Borba. Rubião, o personagem central, já completamente delirante e pirado, adota a filosofia do finado Quincas Borba: uma tribo que elimina a outra atravessa a montanha e se apropria das batatas da tribo derrotada.

Paulinho Kokay, ao eliminar os outros 33 concorrentes, produziu na hora uma belíssima música para a cidade de Passa-Quatro colocada no ar de hora em hora pela emissora de rádio local e que, quiçá um dia será o hino municipal. Ela se tornou o maior sucesso da “ Vento Norte Produção”.

- Ao vencedor, pois, as batatas.

As batatas que Kokay ganhou foram: um passeio turístico na maria-fumaça, uma velha locomotiva de 1929 e um banho em companhia de Mauro Roberto na Cachoeira do Andorinhão, no bairro rural Alto Paiolinho, para usufruir de suas fontes de água medicinal.

P.S. – As informações sobre o Festival foram coletadas por Mauro Roberto que, por coincidência, vem a ser irmão de Kokay, Sérgio, Luciana e Ana Paula, que sonha com Estocolmo, os cinco são filhos de Bibi e Helena, netos de dona Elisa, primos de Geraldinho, Amaro e Fabico, que é pai da Malu e Ana Clara e tio do Silvinho e da Leila,  sobrinhos de Glória, Regina, Dile, Teca, Tuta, Cado, Preta, Celeste, Bambi e Céu. Te passo essa informação, leitor (a), porque assumo que hoje a coluna Taquiprati virou um verdadeiro Tribulins: só entra quem é da família.

Comente esta crônica



Serviço integrado ao Gravatar.com para exibir sua foto (avatar).

7 Comentário(s)

Avatar
Helaine Hintze comentou:
01/07/2021
Tenho vivas as lembranças dessa época. Saudades boas! Gde abço
Comentar em resposta a Helaine Hintze
Avatar
Gretta Bianca Sicsú comentou:
01/07/2021
Prof. Só agora descobri que o senhor é o Paulinho Kokay. ???? Desculpa o meu vacilo.
Comentar em resposta a Gretta Bianca Sicsú
Avatar
Sonia Oliveira comentou:
01/07/2021
Aaahhhh, o sempre fantástico José Bessa. Li e reli a crônica. Grata pela leitura de hoje.
Comentar em resposta a Sonia Oliveira
Avatar
Lucio Flavio Ferraz Chaib comentou:
29/06/2021
Grande abraço, querido amigo Paulo Ricardo. Saudades.
Comentar em resposta a Lucio Flavio Ferraz Chaib
Avatar
Ratto Cascardo comentou:
29/06/2021
Muito bacana essa crônica meu amigo! Voltei no tempo!
Comentar em resposta a Ratto Cascardo
Avatar
Psulo Ricardo Freire comentou:
29/06/2021
Crônica que meu tio José Bessa escreveu em 04 de Maio de 1993, sobre minha participação no Festival Canto de Minas, em Passa Quatro, Minas Gerais, em que venci os prêmios de 1° lugar e melhor intérprete. Lembrança boa demais da conta. Abraços aos amigos Ana Comini, Lucio Flavio Ferraz Chaib, Helaine Hintze, Fátima Carneiro Pereira, Ratto Cascardo e tantos outros com os quais criei laços a partir deste festival.
Comentar em resposta a Psulo Ricardo Freire
Respostas:
Avatar
Ana Comini comentou:
29/06/2021
Muito legal! Paulo Kokay, espero você por aqui pra rever a linda Passa Quatro. Quem sabe logo após voltar da Terrinha? Dá um beijo em Lisboa pra mim ?. Beijo!!!
Comentar em resposta a Ana Comini