TAQUIPRATI, PUGA: CARTA AO QUASE MAGNÍFICO SYLVIO PUGA
CARTA 01, PUBLICADA NO BLOG NO DIA QUE ANTECEDEU À ELEIÇÃO
Quase Magnífico Reitor Sylvio Puga
Prezado Puga,
Saudações,
Inspirado em Waldick Soriano, escrevo essa carta, mas não repara os senões, para dizer o que sinto e penso sobre a eleição para reitor da UFAM nessa sexta (31). Tenho um irmão querido que te apoia. Admiro Lúcia Puga, de cuja banca de doutorado participei, na UFF, há quatro anos, justamente no dia da última eleição para reitor em que você concorria. Tenho razões para simpatizar contigo. No entanto, não se pode escolher alguém para dirigir uma universidade do porte da UFAM apenas por razões afetivas. Não é uma questão pessoal.
Sinta o meu drama, quase-magnífico. Ajudei a construir dois cursos na UFAM dos quais fui professor concursado: Comunicação Social e História. Atuei nas quatro áreas: ensino, pesquisa, extensão e militância. Dei disciplinas para outros cursos como Letras, Biblioteconomia, Serviço Social. Tive alunos em módulos ministrados para a Pós-Graduação. Fundei a ADUA. Cometi alguns artigos acadêmicos publicados no Brasil e no exterior. Deixei meu umbigo enterrado na velha jaqueira do ICHL. É por isso que me ufano da UFAM.
Aí, fiz concurso para a UERJ e a UNIRIO. Retirei-me da UFAM como o passarinho que voa, mas deixa seu ninho no solo. Ele parte, mas volta. Nunca abandona a cria, o seu torrão. É o que acontece comigo, a UFAM e o bairro de Aparecida. Se sei que o leso do Zé Melo Merenda quer aumentar o ICM, juro que isso me afeta mais do que quando o Pezão, no Rio, atrasa nossos salários. Se noticiam a construção e a instalação do novo HUGV, eu aqui no Rio celebro com foguetório. Alegro-me com as ações do vice-reitor para criar a Casa do Estudante dos campi do interior. Ou seja, saí da UFAM, mas ela não sai de mim.
Por isso, meu querido quase-magnífico, dou picica em todas as eleições da UFAM, minha alma mater, desde a época em que, depois de muita luta, conquistamos o direito de eleger nossos reitores. É que eu estava lá, na primeira hora, junto com muitos colegas que já se foram. Somos não apenas testemunhas, mas agentes ativos dessa parte da história da UFAM.
Desta forma, acredito que é preciso combater a perversão desse processo de escolha, não deixando que ele se contamine com o discurso e a prática populista. Com todas as divergências políticas, ideológicas ou até pessoais com algum ex-reitor, não dá agora para regredir. Com ou contra o meu voto simbólico, elegemos reitores comprometidos não com seus partidos (ter partido é legítimo, aparelhar é nocivo), mas com a Universidade que não pode abrigar vícios que condenamos nas eleições em certos grotões do Brasil.
Um amigo me escreve do Alto Solimões, contando que no moderno e climatizado auditório do prédio do Instituto de Natureza e Cultura de Benjamin Constant, onde palestrei duas ou três vezes, o candidato a reitor Sylvio Puga prometeu asfaltar aquela cidade que a incompetência da prefeita anterior deixou virar uma cratera. E ainda prometeu comprar um gerador de luz de grande potência capaz de fornecer luz também para fora. Isso me fez lembrar o Gregório, segurança do Mestrinho, que prometeu asfaltar Itacoatiara e se não fosse possível, apedrejar a cidade toda.
Não faça isso, caro quase-magnifico! Não apedreje a UFAM. Não engane alunos, professores, técnicos. Um reitor não pode fazer isso, a UFAM não tem competência legal para o gasto prometido. Não degrade a vida acadêmica, trazendo práticas eleitoreiras dos políticos populistas e corruptos.
Li o seu programa e me chocou a forma como tenta explorar o medo das pessoas no que se refere à violência no campus, que parece ser um fato, mas não pode ser usado eleitoralmente, aumentando ainda mais a insegurança das pessoas e a sensação de medo. Diz que vai ampliar o número de vigilantes, mas não explica de onde vai tirar os recursos. Promete uma maior aproximação com a segurança estadual, como se isso resolvesse o problema.
Sua propaganda eleitoral jura que “Para melhorar, tem que mudar”. Desculpa, quase magnífico, mas isso não é mudança nem aqui nem na China. É retrocesso mesmo.
Fui comparar com o programa da Chapa 17 que pretende fortalecer ações de segurança pessoal e patrimonial na UFAM, sem alarmismo, sem invocar a repressão, com políticas afirmativas de ocupação do campus. Fiquei entusiasmado com a preocupação do Hedinaldo e da Nikeila com as minorias, com os discriminados e com o meio ambiente agredido, num respeito à diversidade da vida e das culturas.
“Quase magnífico” – entenda esse tratamento não como algo depreciativo, mas como uma brincadeira. Em todas as eleições você é sempre considerado ex-quase-futuro-reitor. Essa não é diferente. Admiro tua tenacidade e tua insistência em ser reitor. Eu juro, maninho, daqui a 4 anos, conta com o meu voto, se observares bem a administração do Edinaldo para ver como é a gestão de uma universidade, se fizeres uma campanha limpa, sem caluniar ninguém, com respeito, sem promessas mirabolantes que não indicam o caminho de sua realização, sem tentar ganhar assustando as pessoas. Mas conta só em 2021 e sob essas condições. AGORA, meu voto que não entra na urna – por isso peço que quem puder vote por mim – é o 17, Hedinaldo Narciso Lima e Nikeila Chacon de Oliveira Conde.
Ah, uma última observação antes de me despedir: em 2021 escolhe uma mulher para vice, com todo o respeito ao Jacob Cohen. Afinal uma universidade não é o ministério do Temer. Se eu fosse mulher, jamais votaria numa chapa só de machos. Sendo homem, quero votar numa chapa que tenha uma mulher. E não sendo nem uma coisa nem outra, teria uma razão ainda mais forte para votar numa chapa com mulher. E essa questão de gênero é muito séria. Numa universidade e numa sociedade onde as mulheres desempenham um papel fundamental e são discriminadas, é revelador a ausência delas numa chapa. Acredita nesse velho aqui, quase septuagenário, que continua na ativa.
CHAPA 17 – NIKEILA PARA VICE, HEDINALDO PARA REITOR.
Não será ainda dessa vez, meu caro quase-magnífico. Mas estamos quase lá. Não desanimemos. Vamos nos preparar para a próxima, com uma mulher de vice.
Amos. Atos. Obros. Foi assim que a Carmela Faraco, na aula de datilografia na Escola Underwood, na Rua Luis Antony, me ensinou a abreviar a fórmula AMIGOS, ATENTOS, OBRIGADOS, com que se finalizava as cartas no século passado.
Taquiprati
Obs. Ver também:
1) VESTIBULAR PARA REITOR DA UFAM (1988) - http://www.taquiprati.com.br/cronica/644-o-vestibular-para-reitor:
2) UMA REITORA PARA A UFAM - CABUCO DA PUPA DA CANUA (2009) - http://www.taquiprati.com.br/cronica/24-uma-reitora-para-a-ufam%20rio%20madeira%20amazonas
3) AS PRIMAVERAS DA UFAM (2012) - http://www.taquiprati.com.br/cronica/984-as-primaveras-da-ufa
4) OS PULMÒES NOVOS DA UFAM (2012) - http://www.taquiprati.com.br/cronica/36-os-pulmoes-novos-da-ufam
CARTA 02, PUBLICADA NO BLOG DEPOIS DO RESULTADO DA ELEIÇÃO
Quase-Magnífico Reitor Sylvio Puga
Saudações,
Ainda inspirado em Waldick Soriano, escrevo outra carta (já são três versões, mas não repare os senões), para felicitá-lo e a seus eleitores pela eleição para reitor da UFAM. Conhecido o resultado, começo desde já as cobranças ou quase-cobranças das promessas de campanha, não por birra, mas pela saúde da universidade. Essa é versão modificada da que vai publicada na edição impressa do Diário do Amazonas (02/04) escrita antes da contagem dos votos. Agora, mais do que nunca, parece apropriado continuar com o tratamento de quase-reitor. Depois da posse, a gente elimina o “quase”.
O poder, qualquer poder, por menor que seja, atrai uma cambada de puxa-sacos como o mel chama as moscas. Pensei em somar-me a eles, mas não levo jeito, nem domino as habilidades necessárias. Careço de know-how, de savoir-faire e até de coragem para isso. Entenda, portanto, as felicitações como um gesto de cortesia, de quem sabe perder ou pelo menos finge que sabe. Se me permite, gostaria então de continuar empentelhando vossa quase-magnificência, mantendo o rumo contrário. Parece que estou fugindo, me indispondo com a metade da universidade. Será?
Uma onda conservadora toma conta do Brasil, do mundo, das instituições. Pensando bem, quase-magnífico, sua vitória vai no rumo certo. Quem estava na direção contrária era o programa da outra chapa. Confesso que minha crítica começou quando vi um de vossos soldados entupir o facebook com 17 fotos grandes e escandalosas de cadáveres e de manchetes espalhafatosas sobre mortes, assaltos, violência no campus, atribuindo tudo isso à incompetência do atual reitor, seu oponente. Dizia que eram 17 motivos para não votar na Chapa 17.
Esse pânico criado por baixo dos panos, presente no discurso do Bolsonaro, alimentou desde a campanha vitoriosa de Crivella, no Rio, até a de Trump, nos Estados Unidos, passando por Temer, cujo ex-ministro da Justiça, o Kinder-Ovo, agora guindado ao Supremo Tribunal Federal, prometia aumentar a repressão para acabar com as rebeliões nas prisões. Cria-se o pânico, para em seguida anunciar que só a porrada resolve. Tais práticas eleitoreiras me chocaram.
Pois bem, a hora da quase-verdade ou da quase-mentira se aproxima. Agora, além de resolver os problemas de luz e asfalto em Benjamin Constant – há quem jure sobre a Bíblia que ela não foi feita, mas isso é secundário – vossa quase-magnificência prepare-se para contratar quase-vigilantes e buscar para isso os quase-recursos, conforme consta do seu programa.
Minha querida amiga, a historiadora Maria José Feres Ribeiro, quando deixou a presidência da ANDES, de cuja diretoria fiz parte, se candidatou à reitora da Universidade Federal de Juiz de Fora. Num debate com os demais candidatos, um funcionário no auditório perguntou sobre o que achavam da proposta de reduzir a jornada de trabalho para 30 horas. Todos os candidatos, em busca de votos, concordaram, exceto Zezé que corajosamente se manifestou contrária à reivindicação corporativista, por considerar que prejudicava a instituição e o atendimento aos alunos. Ela, evidentemente, perdeu a eleição. O vencedor, evidentemente, não cumpriu sua promessa.
Para ganhar votos, vossa quase-magnificência prometeu reduzir a jornada em 30 horas para todos, insalubridade para aposentados, aumento salarial para os servidores do HUGV, etc, etc. Coloco-me à disposição dos seus eleitores para ao longo dos quatro anos fazermos juntos a cobrança do cumprimento dessas promessas mirabolantes no contexto em que vivemos.
E pelo amor de Deus, não tenho qualquer motivo pessoal para criticá-lo, trata-se de uma discussão política sobre práticas eleitoreiras e sobre o destino da nossa querida universidade. Não dramatizemos, sua eleição não é o fim do mundo, afinal vossa quase-magnificência não tem o poder de apertar o botão da guerra nuclear como o Trump. Mas que pode fazer estragos, pode. Suspeito que fará. Juro – quero ver a mãe do Trump mortinha no inferno se eu estiver mentindo – que torço para que a nova administração consiga manter a UFAM nos trilhos.
Amos. Atos. Obros, como me ensinou a Carmela Faraco, na Escola de Datilografia Underwood, na Rua Luis Antony
Do seu quase-eleitor, Taquiprati.
P.S. – Ao Hedinaldo Narciso Lima e Nikeila Chacon de Oliveira Conde, a quem não tive o prazer de conhecer pessoalmente, minha sincera admiração por terem continuado caminhando na direção contrária. Não nos conhecemos, mas na próxima vez além das razões de ordem programática e da comunhão de um ideal de universidade, terei uma razão a mais - a afetiva - para caminharmos juntos.
UMA QUASE-CARTA PARA UM QUASE-REITOR
(Versão impressa - Diário do Amazonas - 02/04)
Quase Magnífico Reitor Sylvio Puga
Saudações,
Inspirado em Waldick Soriano, escrevo essa carta, mas não repare os senões, para dizer o que sinto e penso sobre a eleição para reitor da UFAM nessa sexta (31). Escrevo sem conhecer o resultado, mas quem lê o texto na edição impressa de domingo do Diário do Amazonas já está sabendo. Qualquer resultado me permite manter o tratamento de quase-reitor usado em carta anterior. Ganhou? O “quase” significa, então, que em breve vossa quase-magnificência assumirá a reitoria. Perdeu? Fica como alusão às várias tentativas feitas, sem qualquer intenção de tripudiar.
Na primeira carta dizia que tenho razões para simpatizar com vossa quase-magnificência por ter relações de amizade com alguns de seus apoiadores. No entanto, não se pode escolher alguém para dirigir uma universidade, uma cidade ou um país apenas por razões afetivas, embora haja quem acredite nisso, o que é um equívoco, porque confunde a questão pública com a privada. Não se trata de questão pessoal, mas de julgamento político. A avaliação política pode estar certa ou errada, mas a escolha focada exclusivamente na relação pessoal ou familiar sempre será equivocada.
Sinta o meu drama, quase-magnífico. Ajudei a construir dois cursos na UFAM dos quais fui professor concursado: Comunicação Social e História. Atuei nas quatro áreas: ensino, pesquisa, extensão e militância. Dei disciplinas para Letras, Biblioteconomia, Serviço Social. Tive alunos em módulos ministrados para a Pós-Graduação. Mesmo desligado da UFAM, ministrei vários módulos em curso de licenciatura em Benjamin Constant. Fundei a ADUA. Briguei muito. Fiz amigos e inimigos. Cometi artigos acadêmicos publicados no Brasil e no exterior. Deixei meu umbigo enterrado na velha jaqueira do ICHL. Plantei sementes no campus que se tornaram árvores frondosas e deram frutos.
É por isso que me ufano da UFAM. No entanto, a vida me levou a continuar meu trabalho na UERJ e na UNIRIO. Retirei-me da UFAM como o passarinho que voa, mas deixa seu ninho no solo. Ele parte, mas volta. Nunca abandona a cria, o seu torrão. É o que acontece comigo, a UFAM e o bairro de Aparecida. Celebro com foguetório, aqui no Rio, a notícia da construção e da instalação do novo HUGV. Alegro-me com as ações do vice-reitor para criar a Casa do Estudante dos campi do interior. Ou seja, saí da UFAM, mas ela não sai de mim.
Por isso, meu querido quase-magnífico, dou picica em todas as eleições da UFAM, minha alma mater, desde a época em que, depois de muita luta, conquistamos o direito de eleger nossos reitores. É que eu estava lá, na primeira hora, junto com muitos colegas que já se foram. Somos não apenas testemunhas, mas agentes ativos dessa parte da história da UFAM.
A bronca e a crítica que tenho está relacionada ao discurso e à prática populista de vossa quase-magnificência, que destrói a sociedade brasileira e não devia ter lugar em uma universidade que não pode abrigar vícios condenados nas eleições em grotões do Brasil: promessas descabidas. Não vou nem mencionar o discurso feito no Alto Solimões, porque envolve diferentes interpretações. Vou me ater ao seu programa.
Algumas propostas, eleitoreiras, me chocaram, como a exploração do medo das pessoas quanto à violência no campus, que parece ser um fato, mas não pode ser atribuído à outra chapa, nem usado eleitoralmente, criando pânico, aumentando a insegurança dos estudantes. Diz que vai ampliar o número de vigilantes, mas não explica de onde vai tirar os recursos. Promete maior aproximação com a segurança estadual, como se isso resolvesse o problema. Surfa nessa onda conservadora que vai do pequeno município do Brasil, passa pelo Bolsonaro e vai até o Trump nos Estados Unidos.
Comparei com o programa da Chapa 17 (Hedinaldo e Nikeila) que pretende fortalecer ações de segurança pessoal e patrimonial na UFAM, sem alarmismo, sem invocar a repressão, com políticas afirmativas de ocupação do campus. Fiquei entusiasmado ainda com a preocupação com as minorias, com os discriminados e com o meio ambiente agredido, num respeito à diversidade da vida e das culturas.
Se vossa quase-magnificência ganhou, meus parabéns sinceros, mas lamento dizer que, no meu entender, essa é a vitória de práticas eleitoreiras populistas, que tanto condenamos na sociedade brasileira. Conte comigo para fazer oposição leal e dura nos próximos anos, cobrando a realização das promessas mirabolantes.
Se perdeu, que isso lhe sirva de reflexão e que juntos possamos cobrar de quem ganhou o cumprimento do programa. Em 2021, não esqueça de trazer uma mulher como sua quase-vice. A crítica aqui feita nada tem de pessoal, desejo-lhe felicidade em sua vida pessoal e acadêmica. Acredite nesse velho aqui, quase septuagenário, que continua na ativa.
Amos. Atos. Obros. Foi assim que a Carmela Faraco, na aula de datilografia na Escola Underwood, na Rua Luis Antony, me ensinou a abreviar a fórmula AMIGOS, ATENTOS, OBRIGADOS, com que se finalizava as cartas no século passado.
Do seu quase-eleitor, Taquiprati.