"Sangra o coração do meu Brasil.
O belo monstro rouba as terras dos seus filhos
devora a mata e seca os rios".
(Samba da Imperatriz Leopoldinense , 2017)
Tem um Brasil que está morrendo e outro que está nascendo dentro de um país de cores e cantos tão diversos. Para identificá-los, não precisa ser médico-legista nem parteira. Basta observar neste carnaval o desfile na Sapucaí, mas com os olhos bem abertos para não confundir um com o outro, já que nenhum dos dois tem samba no pé. Um deles arrasta os pés, mancando, porque, decrépito, está com esclerose múltipla, enquanto o outro, hesitante e trôpego, está aprendendo a andar e ensaia no sambódromo seus primeiros passos. Só pode ver a diferença quem, entendendo a língua dos pássaros, das árvores e dos rios, é capaz de decifrar seus gemidos.
Berço do renascimento
O Brasil com um pé dentro do caixão fez tudo para abortar o parto do Brasil com um pé fora do berço. Em vão. Domingo (26), logo depois da meia-noite, cerca de 3.000 componentes da Imperatriz Leopoldinense, entre eles Raoni e outros índios, desfilam em 32 alas e seis carros alegóricos com a rainha de bateria, Cris Vianna, e mestre Lolo no comando da percussão. "Xingu, o clamor da floresta" canta aquilo que foi explorado na Rio-92 por Daniel Matenho Cabixi, um intelectual Pareci, com a palestra "As tecnologias dos povos indígenas na preservação do meio ambiente" publicada pela UERJ.
O enredo celebra os saberes das etnias que vivem no Parque Indígena do Xingu (MT) e a contribuição das civilizações indígenas - "a primeira semente da alma brasileira" - na defesa da natureza agredida, da beleza e exuberância de cores da floresta e de rios limpos e piscosos. Exalta as pinturas corporais, o artesanato, os instrumentos musicais - as flautas e os maracás, a liberdade e a memória sagrada. Dá visibilidade aos índios, fazendo aquilo que a escola, que não é de samba, devia fazer, mas raramente faz. A letra do samba-enredo já foi tema de aulas no Colégio Faria Brito, Zona Oeste do Rio e no Colégio-Curso Martins, em Vila Isabel, Zona Norte, contribuindo para a implementação da Lei 11.645 que torna obrigatória a temática indígena em sala de aula. "Salve o verde do Xingu, a esperança, a semente do amanhã!".
Esse Brasil que nasce e que está aprendendo a ficar de pé inaugura o diálogo do carnaval com a academia e com os índios, quase sempre discriminados como atrasados ou então folclorizados como exóticos. Da Antropologia, a escola de samba toma emprestado o trabalho de campo como forma de entender o outro, o diferente. Busca na Museologia a curadoria compartilhada com os índios na organização de exposições. Recorre à História para abordar acontecimentos com o conceito de longa duração de Fernand Braudel, abandonando o fatual, nomes de heróis fajutos e sucessão de datas inúteis.
Foi assim que, assessorado pelo antropólogo Carlos Fausto do Museu Nacional (UFRJ), o carnavalesco Cahê Rodrigues se deslocou ao Xingu onde conviveu com os índios, observou o cotidiano e com eles concebeu o enredo. Viu a área contaminada por agrotóxico, causador de câncer que já matou muitos índios. Viu os rios secando e a mata morrendo. "Voltei de lá com outra cabeça" - disse em entrevista. Viajou para lá com a mente do general Custer e retornou pensando como Touro Sentado, a exemplo do ministro Ayres Brito, do STF, no processo da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Deixou-se educar pelos índios, os maiores especialistas em educação ambiental..
Escola sem partido
O enredo, dividido em seis setores, começa com o sagrado, passa pelas riquezas da flora e da fauna e aborda a invasão e o roubo de terras. Depois mostra as queimadas, as madeireiras, o agrotóxico e Belo Monte. As alianças de índios com não índios na defesa do Xingu é o quinto carro, o último é o clamor que vem da floresta. Isso foi suficiente para que o outro Brasil com o pé no caixão, passasse a agredir a Imperatriz Leopoldinense e incorporasse as escolas de samba no conceito de "escolas sem partido", que querem nos impor. Mesquinhos, não admitem versão crítica, nem no carnaval. Querem ter o monopólio da narrativa histórica por acreditarem que isso favorece a expansão da soja, do pasto para boi e a ocupação de terras indígenas por ruralistas.
Na última década, em carnavais anteriores, vários desfiles exaltaram a expansão do agronegócio, financiados pelos ruralistas preocupados em limpar a barra diante da opinião pública. A então presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), senadora Kátia Abreu, desfilou em uma delas, a Mocidade Independente de Padre Miguel que saiu, em 2011, com o enredo "Parábolas dos divinos semeadores", financiada por empresas de fertilizantes.
O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO, vixe vixe), figura sinistra do "divino semeador", propõe uma CPI "para discutir, debater e descobrir os financiadores da Imperatriz Leopoldinense". A Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ) em carta atacou a escola de samba. Lideranças ligadas ao plantio de soja, milho, algodão e cana de açúcar se pronunciaram, alegando que o agronegócio é responsável pela comida e bebida consumida por turistas no carnaval. Circulou até mesmo denúncia, não confirmada, em matéria assinada por João Paulo Saconi, de que empresários teriam oferecido R$ 15 milhões aos índios para que não desfilassem.
A escalada de violência culminou com o programa "Sucesso do Campo" da Rede Goiás, afiliada da Record, quando a jornalista Fabélia Oliveira, comentando o samba-enredo da Imperatriz, naturalizou as mortes dos índios, declarando que o índio "vai ter mesmo que morrer de malária, de tétano, de parto" . É a natureza". Estranha concepção da natureza aliada à morte. Para desqualificar o enredo, ela ajumentou que "o tradicional malandro carioca" não tem autoridade para falar do índio e da floresta.
Dinossauros em extinção
O carnavalesco Cahê Rodrigues ficou assustado:
- Eles insistem em agredir a todo instante, com algumas colocações preconceituosas e racistas. Além de ofensas à escola, eles diminuem a imagem do índio, como se o índio não fosse nada. O índio não tem voz. Todas as vezes que ele quer falar, é calado. O tema foi desenvolvido nas histórias de conquistas e de lutas dos índios do Xingu.
Os dinossauros são ricos, arrogantes e têm poder, nem parece que estão com o pé na cova. Lembrei, porém, de uma charge publicada há anos na capa de uma revista francesa que, para ser didática, comete uma impropriedade histórica confundindo temporalidades. Mostra um gigantesco dinossauro que vigiava uma caverna, onde dois seres humanos, pequenos e frágeis, tremiam de medo. Um deles falou assim para o outro: “Por incrível que pareça, esse monstrengo aí fora, grande e forte, está condenado a desaparecer. Quem vai se perpetuar somos nós, seres humanos, pequenos e desprotegidos". Historicamente, na perspectiva de longa duração, a classe que emprega agrotóxicos vai se extinguir como os dinossauros.
O Brasil que está nascendo é aquele que, segundo o antropólogo Darell Posey, leva a sério o conhecimento dos índios, incorporando-o à ciência moderna e aos programas de pesquisa e desenvolvimento, que valoriza os índios pelo que são: "povos engenhosos, inteligentes e práticos que sobreviveram com sucesso por milhares de anos na Amazônia". Tal postura, cria uma ponte ideológica entre culturas, que permite "a participação dos povos indígenas, com o respeito e a estima que merecem, na construção de um Brasil moderno".
É essa ponte que a Imperatriz Leopoldinense está ajudando a construir. Se o Brasil que morre está tão incomodado, é porque teme que o Brasil que renasce dê uma grande aula na Sapucaí, construindo outra narrativa na passarela mágica e dionisíaca do carnaval, o único espaço no Brasil em que utopia dá certo. Darcy Ribeiro, o criador do Sambódromo, Berta Ribeiro, Maria Yedda Linhares, John Monteiro, Antônio Brand e tantos outros amigos dos índios devem estar requebrando alegremente na tumba ao som do samba da Imperatriz. Olha o índio aí, gente.
P.S. - Convém se concentrar nos pequenos atos e gestos cotidianos do novo Brasil que está renascendo, traz esperança e não nos deixa adoecer diante do quadro político dominado pelos "dinossauros" Foi o caso da defesa de três dissertações no Programa de Pós-Graduação em Memória Social da UNIRIO: 1) na segunda (20) Ignacio Gomeza Gomez - "Em busca da memória e da identidade: o povo Charrua no Uruguai e Brasil" (Banca: João Pacheco de Oliveira, Amir Geiger e José R. Bessa (orientador); 2) na terça (21), Renata Póvoa Curado - "Memórias tradicionais como performances culturais: experiências na Aldeia Indígena Multiétnica em Goiás" (Banca: Luisa Belaunde, Zeca Ligiéro e José R. Bessa (orientador); 3) Mariane do Nascimento Vieira - "Narrativa dos Ameríndios: disseminação de uma visão do contemporâneo" (Banca: Amir Geiger (orientador), Thiago Loureiro e José R. Bessa.
OBS: A foto tirada pela fotógrafa Liliam Tataxinã no Museu do Indio do Rio de Janeiro no lançamento do livro de Lucy Seki "O que habitava a boca de nossos ancestrais (ver abaixo) foi usada por José Amaro Juniror, da Ugagogo de Manaus, que a incorporou à outra foto mais recente pescada no facebook, tendo ao fundo a passarela da Sapucaí. Abaixo, as duas fotos originais. (ver A BOLA DOS KAMAIURÁ - http://www.taquiprati.com.br/cronica/982-a-bola-dos-kamaiura)
Já a foto em que aparece a senadora Katia Abreu não é montagem.
OLHA O ÍNDIO AÍ, GENTE! (*)
(*) (Grito típico del maestro de la escuela de samba - “puxador do samba”)
Texto: José R. Bessa Freire. Tradução: Consuelo Alfaro Lagorio
Edición digital nº +599 - 02 Mar 2017 - 17:57:
"Sangra el corazón de mi Brasil.
El bello monstruo roba las tierras de sus hijos
devora la floresta y seca los ríos".
(Samba de la Escuela Imperatriz Leopoldinense , 2017)
Hay un Brasil que está muriendo y otro que está naciendo dentro de un país de colores y cantos tan diversos. Para identificarlos, no se necesita ser médico-legista ni partera. Basta observar en este carnaval el desfile del “sambódromo” en la avenida Sapucaí, Rio de Janeiro, con los ojos bien abiertos para no confundirlos, ya que ninguno de los dos sabe bailar samba. Uno arrastra los pies, cojeando por decrepitud, está con esclerosis múltiple, mientras que el otro, titubeante y tambaleante, está aprendiendo a andar y ensaya en el “sambódromo” sus primeros pasos. Solo puede ver la diferencia quien, entendiendo la lengua de los pájaros, de los árboles y de los ríos, es capaz de descifrar sus gemidos.
Cuna de renascimiento
El Brasil con un pie en la tumba hizo de todo para abortar el parto del Brasil con el pie en la cuna. En vano. El domingo (26), después de media noche, cerca de 3.000 componentes de la Escuela de Samba Imperatriz Leopoldinense, entre ellos Raoni Metuktire, gran jefe Kayapó y otros líderes indígenas, desfilan en 32 alas y seis carros alegóricos con la “reina de batería”, Cris Vianna, y el maestro Lolo, comandante de la percusión. El tema "Xingú, el clamor de la floresta" canta aquello que fue explorado en el encuentro de la ECO-92 por Daniel Matenho Cabixí, un intelectual Parecí, con la conferencia "Las tecnologías de los pueblos indígenas en la preservación del medio ambiente" publicada por la Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.
Aquí se exaltan los saberes de las etnias que viven en el Parque Indígena de Xingú (MT) y la contribución de las civilizaciones indígenas - "la primera semilla del alma brasileña" – en la defensa de la naturaleza agredida, de la belleza y exuberancia de colores de la floresta y de ríos limpios llenos de peces. Destaca las pinturas corporales, la artesanía, los instrumentos musicales - las flautas y las maracas, la libertad y la memoria sagrada. Da visibilidad a los indios, haciendo aquello que la escuela, que no es de samba, debería hacer, pero que raramente lo hace. La letra del samba ya fue tema de clases en el Colegio Faria Brito, Zona Oeste de Rio y en el Colegio-Curso Martins, en Vila Isabel, Zona Norte, contribuyendo en el cumplimiento de la Ley 11.645 que torna obligatoria la temática indígena en sala de clase. "Salve el verde del Xingú, la esperanza, la semilla de mañana!".
Este Brasil que nace y que está aprendiendo a pararse inaugura el diálogo del carnaval con la academia y con los indios, casi siempre discriminados como atrasados o folclorisados como exóticos. De la Antropología, la escuela de samba recurre al trabajo de campo como forma de entender el otro, lo diferente. Busca en la Museología la responsabilidad compartida con los indios en la organización de exposiciones. Recurre a la Historia para abordar acontecimientos con el concepto de larga duración de Fernand Braudel, abandonando lo factual, nombres de héroes falsificados y la sucesión de fechas inútiles.
Fue así que asesorado por el antropólogo Carlos Fausto del Museo Nacional (UFRJ), el carnavalesco Cahê Rodrigues se dislocó hasta el Xingú donde convivió con los indios, observó la vida cotidiana y con ellos concibió el tema. Vio el área contaminada por agro-tóxico, que causó cáncer y que ya mató muchos indios. Vio los ríos secando, envenenados, y la floresta muriendo. "Volví de allí con otra cabeza" - dijo en una entrevista. Fue con la mente del general Custer y retornó pensando como Toro Sentado, como el ministro Ayres Brito, del STF, en el proceso que llevó al reconocimiento de la Tierra Indígena Raposa Serra do Sol. Se dejó educar por los indios, los mayores especialistas en educación ambiental.
Escuela sin partido
El desfile de la escuela, dividido en seis sectores, comienza con lo sagrado, pasa por las riquezas de la flora, de la fauna y aborda la invasión y el robo de tierras. Después muestra las quemadas, las madereras, el agro-tóxico y Belo Monte, una polémica usina hidroeléctrica denunciada en el escándalo de corrupción. Las alianzas de indios con no indios en la defensa del Xingú es el quinto carro, el último es el clamor que viene de la floresta.
Eso fue suficiente para que el otro Brasil con un pie en la tumba, pasase a agredir a la escuela Imperatriz Leopoldinense y extender a las escuelas de samba el concepto de "escuelas sin partido", que quieren imponernos. Hay dos proyectos tramitando en la Camara de Diputados y en el Senado que prohíben lo que dicen ser “la doctrinación política e ideológica” en el sistema de educación pública. Hay otro proyecto que altera el Código Penal para incluir la prisión del profesor que practicar el asedio ideológico. Ahora, mesquinos, no admiten una versión crítica, ni siquiera en carnaval. Quieren el monopolio de la narrativa histórica porque creen que eso favorece la expansión de soja, de pasto para la ganadería y la ocupación de tierras indígenas por hacendados.
Omiten que en carnavales anteriores, durante la última década, varios desfiles exaltaron la expansión del agro-negocio, financiados por los ruralistas preocupados con la opinión pública. La que entonces era presidente de la Confederación Nacional da Agricultura (CNA), senadora Kátia Abreu, desfiló en una de ellas, la Mocidade Independente de Padre Miguel que salió en 2011, con el tema "Parábolas de los divinos sembradores", financiada por empresas de fertilizantes.
El senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), figura siniestra del "divino sembrador", quería una Comisión Parlamentar de Inquérito (CPI) "para discutir, debatir y descubrir los financiadores de la Imperatriz Leopoldinense". La Asociación Brasileña de Criadores de Zebu (ABCZ) en carta atacó la escuela de samba. Líderes ligados a los plantíos de soja, maíz, algodón y caña de azúcar se pronunciaron, alegando que el agro-negocio es responsable por la comida y bebida consumida por turistas en el carnaval. Llegó a circular una denuncia, no confirmada, en un artículo firmado por João Paulo Saconi, de que empresarios habrían ofrecido R$ 15 millones a los indios para que no desfilaran.
El avance de violencia culminó con el programa de televisón "Éxito del Campo" de la Red Goiás, afiliada a la Record, cuando la periodista Fabélia Oliveira, comentando el tema del samba de la Imperatriz, consideró natural las muertes de los indios, declarando que el indio "tiene que morir de malaria, de tétano, de parto". Es la naturaleza". Extraña concepción de naturaleza aliada a la muerte. Para descalificar el tema, “argumentó” que "el tradicional malandro carioca" no tiene autoridad para hablar sobre el indio y de la floresta.
Dinosaurios en extinción
El carnavalesco Cahê Rodrigues se asustó:
- Ellos insisten en agredir a todo instante, con algunas posturas prejuiciosas y racistas. Además de ofensas a la escuela, disminuyen la imagen del indio, como si no valiera nada. El indio no tiene voz. Toda vez que quiere hablar, lo callan. El tema se desarrolla con las historias de conquistas y de luchas de los indios del Xingú.
Los dinosaurios son ricos, arrogantes y tienen poder, es difícil admitir que van a desaparecer. Recuerdo una caricatura publicada hace años en una revista francesa, que para ser didáctica comete una impropiedad histórica, confundiendo temporalidades. Muestra un gigantesco dinosaurio que vigilaba una caverna, donde dos seres humanos, pequeños y frágiles, temblaban de miedo. Uno le dice al otro: “Por increíble que parezca, ese monstruo ahí afuera, grande y fuerte, está condenado a desaparecer. Ya nosotros, seres humanos, pequeños y desprotegidos, vamos a perpetuarnos". Históricamente, en una perspectiva de larga duración, la clase que usa agro-tóxicos debe extinguirse, como los dinosaurios.
El Brasil que está naciendo es aquel que, en la perspectiva del antropólogo Darell Posey, lleva a serio el conocimiento de los indios, incorporándolo a la ciencia moderna, a los programas de investigación y desarrollo, dando valor a los indios porque son: "pueblos ingeniosos, inteligentes y prácticos que sobrevivieron con éxito por millares de años en la Amazonía". Tal postura, crea un puente ideológico entre culturas que permite "la participación de pueblos indígenas, con el respeto y la estimación que merecen, en la construcción de un Brasil moderno".
Ese es el puente que la Imperatriz Leopoldinense está ayudando a construir. Si al Brasil que muere le incomoda tanto, es porque teme que el Brasil que renace de una aula magna en la avenida Sapucaí, construyendo otra narrativa en la pasarela mágica y dionisíaca del carnaval, el único espacio del Brasil en que la utopía se realiza. Darcy Ribeiro, el creador del Sambódromo, Berta Ribeiro, Maria Yedda Linhares, John Monteiro, Antônio Brand y tantos otros amigos de los indios deben estar bailando alegremente en la tumba al ritmo del samba de la Imperatriz. Olha o índio aí, gente.
P.S. – Los pequeños actos y gestos cotidianos del nuevo Brasil que está renaciendo alimentan la esperanza. El tema indígena hace parte de três tesis del Programa de Pós-Graduação em Memória Social da UNIRIO defendidas esta semana:
1) El dia 20, Ignacio Gomeza Gomez - "Em busca da memória e da identidade: o povo Charrua no Uruguai e Brasil";
2) El 21, Renata Póvoa Curado - "Memórias tradicionais como performances culturais: experiências na Aldeia Indígena Multiétnica em Goiás";
El 22, Mariane do Nascimento Vieira - "Narrativa dos Ameríndios: disseminação de uma visão do contemporâneo".
Quando il carnevale è cultura
27.02.2017 - Loretta Emiri (*)
In Brasile il Carnevale inizia il Giovedì grasso e finisce all’alba del giorno delle Ceneri. Quest’anno la scuola di samba Imperatriz, di Rio de Janeiro, ha incentrato la propria allegoria sugli indios dello Xingu e sulla loro lotta per la preservazione di territorio e diritti. Il coreografo della scuola ha chiesto la consulenza di un antropologo e si è recato nel Parco Indigeno dello Xingu, area in cui vivono diciassette differenti etnie. Sulla carta il territorio è protetto, nella realtà è contaminato da agro-tossici, i suoi fiumi stanno seccando, la foresta è progressivamente divorata. Il coreografo ha concepito lo spettacolo insieme agli indios, convivendo con loro, ascoltandoli. Le varie sezioni della parata carnevalesca affrontano temi legati alla sacralità dei territori indigeni, alla ricchezza di flora e fauna, all’invasione e furto delle terre indigene, agli incendi, alle segherie, ai prodotti agro-tossici, a un’idroelettrica mostruosa beffardamente chiamata Belo Monte, alle alleanze degli indios con i non indigeni. Quando è trapelato il tema scelto per la propria rappresentazione, la scuola e i suoi componenti hanno sofferto pressioni, minacce, violenze verbali, attacchi dei mezzi di comunicazione di massa, naturalmente sempre asserviti ai (pre)potenti di turno.
Un nutrito gruppo di leader indigeni, tra cui alcune battagliere amazzoni, ha visitato la scuola di samba per ringraziarla della coraggiosa scelta fatta. Durante la conferenza stampa indetta dalla scuola Imperatriz ha parlato, nella sua lingua, lo storico leader indigeno dello Xingu, Raoni, il quale, tra l’altro, ha detto di sentirsi vecchio e stremato dalla lotta portata avanti durante tutta la vita. Un interprete ha tradotto il suo pensiero in portoghese, ma il timbro di voce di Raoni era ben più persuasivo, convincente, caldo, emozionante delle parole in portoghese, che resta pur sempre la lingua degli invasori e colonizzatori. Sugli striscioni posti accanto al tavolo da cui il leader indigeno ha parlato c’era scritto: “Il nostro oro è la natura”, “La nostra energia è la vita”.
La Imperatriz ha messo in campo tremila figuranti, trentadue cosiddette ali, sei carri allegorici. Agli indios è stata assicurata una grande visibilità, attraverso la valorizzazione di pitture corporali, artigianato, strumenti musicali, tecnologie atte a preservare l’ambiente, e attraverso anche la valorizzazione della sacralità del loro rapporto con la natura. La scuola di samba ha attinto dall’antropologia, dalla museologia, dalla storiografia per allestire uno spettacolo che non ha discriminato gli indios facendoli apparire come arretrati, né li ha consegnati al folclore spacciandoli per esotici. Il Carnevale carioca di quest’anno ha dialogato con gli indios e i loro alleati del mondo accademico. Una scuola di samba ha contribuito a far capire al popolo brasiliano quale differenza passa tra una manifestazione di folclore e un’espressione di cultura, e ha anche fornito il suo apporto alla lotta contro preconcetti e razzismo. Accanto a personalità varie e molti leader indigeni, il vecchio Raoni ha preso parte alla parata carnevalesca e si è immerso nella moltitudine del sambodromo di Rio de Janeiro, contribuendo a far giungere “il clamore che viene dalla foresta” fin dentro l’udito di chi non vuol sentire.
(*) Loretta Emiri ha vissuto per diciotto anni nell’Amazzonia brasiliana. Durante i primi quattro anni e mezzo ha operato tra gli yanomami svolgendo assistenza sanitaria, ricerche linguistiche e un progetto chiamato Piano di Coscientizzazione, di cui l’alfabetizzazione di adulti nella lingua materna faceva parte. In quell’epoca ha prodotto saggi e lavori didattici, tra i quali Gramática pedagógica da língua yãnomamè (Grammatica pedagogica della lingua yãnomamè), DicionárioYãnomamè-Português (Dizionario Yãnomamè-Portoghese). Specializzatasi nella legislazione dell’educazione scolastica indigena, ha organizzato e partecipato, in veste di docente, a incontri e corsi di formazione per maestri di varie etnie, contribuendo a far incorporare le loro rivendicazioni alla Costituzione. Ha curato l’edizione di A conquista da escrita – Encontros de educação indígena (La conquista della scrittura – Incontri di educazione indigena), che documenta le prime esperienze scolastiche di quindici popoli indigeni. Ha fatto parte del Gruppo di Lavoro istituito dal Ministero dell’Educazione per definire la politica nazionale per l’Educazione Scolastica Indigena. Sua è la redazione finale della proposta di creazione di una scuola specifica, differenziata e pubblica per la formazione dei maestri indigeni dello Stato di Roraima; approvata all’unanimità nel novembre del 1993, è divenuta la prima scuola del genere in Brasile. Nell’adempimento dei ruoli ricoperti in organi pubblici o privati, ha sempre sostenuto le lotte per l’autodeterminazione travate dal movimento indigeno organizzato brasiliano che, tra l’altro, ha trasformato la “scuola per gli indios” in “scuola indigena”, pensata e amministrata da loro stessi e la cui finalità è anche quella di affermare identità etniche e rivendicare diritti. Attraverso la rielaborazione esplicita e voluta dell’esperienza fatta, sta dando continuità all’esperienza stessa; tra le sue più recenti pubblicazioni in lingua italiana troviamo Amazzonia portatile, Quando le amazzoni diventano nonne, Amazzone in tempo reale. https://www.pressenza.com/it/2017/02/quando-il-carnevale-e-cultura/
Ver também SARAPEGBE - Rivista di Cultura e Società del Brasile e altri mosaici A. VI, no. 14, gennaio-giugno 2017
http://www.sarapegbe.net/articolo.php?quale=125&tabella=nuovi_percorsi