CRÔNICAS

Mercedes Sosa: Dale tu mano al índio. Manaus. ANO III. Nº 19/20

Em: 11 de Junho de 1980 Visualizações: 4542
Mercedes Sosa: Dale tu mano al índio. Manaus. ANO III. Nº 19/20

Maio de 1980. A cantora Mercedes Sosa passa quase incógnita por Manaus, se hospeda no Hotel Tropical e acaba dando um show, que não estava programado, no Teatro Amazonas. Concede longa entrevista a mim e a Natacha Andrade, que era então estudante de jornalismo. Selecionamos o conteúdo e publicamos uma parte no Porantim, tablóide “em defesa da causa indígena”, e a outra, no jornal A Lucta Social, do PT-Amazonas, ambos editados por esse locutor que vos fala.

Foi por acaso que soubemos da presença de Mercedes Sosa. Quem nos avisou foi um dos motoristas do Hotel Tropical, cuja lucta por um piso salarial fixo de 8 mil cruzeiros havia recebido o apoio do PT local, no final de abril. A cantora vivia, naquela época, em Paris, exilada em razão das perseguições da ditadura do general Videla. Escolheu Manaus para descansar de uma excursão artística e conhecer um pouco a Amazônia.

O show no Teatro Amazonas foi resultado de um convite nosso. Improvisado, decidido na última hora, não houve divulgação, a não ser aquela feita boca a boca nas salas de aula da Universidade. Uma mente arejada do governo Lindoso – não lembro mais se foi o poeta Élson Farias – facilitou os contatos institucionais para a cessão do teatro. O certo é que no dia 6 de maio, a grande intérprete da canção latinoamericana cantava, com a casa lotada, os ingressos vendidos a preço popular de 100 cruzeiros (Ela recusou proposta feita para cobrar mil cruzeiros).

Falecida domingo passado, em Buenos Aires, Mercedes Sosa tinha 44 anos quando passou por Manaus, explodia de criatividade e conservava rara beleza outonal, como mostra a foto do Porantim. Cantou músicas conhecidas do seu repertório, duas delas na língua Toba, um povo indígena da Argentina. Após o show, voltamos a conversar. Reproduzo trechos da entrevista publicada nos dois jornais, cujos exemplares arquivei.

La mano al índio

“Mercedes Sosa: Dale tu mano al índio” – essa foi a manchete de página do Porantim (Manaus, ano III, nº 19/20 junho/julho 1980), que puxava brasa pra nossa sardinha, citando Canción para mi América - cantada no show no Teatro Amazonas, de autoria do uruguaio Daniel Viglietti: “Dale tu mano al índio / dale que te hará bien / y encontrarás el camino / como ayer yo lo encontré”.

No entanto, Mercedes não caiu na armadilha de particularizar a luta: “Estou cantando para que se estenda a mão não apenas ao índio, mas ao homem da América Latina. Canto por todos os oprimidos, pelos índios, pelo trabalhador, pela mulher, pelo negro e por todos os marginalizados”. A cantora, desde o ‘Nuevo Cancionero’, nos anos 1960, sempre mostrou preocupação com a vida cotidiana dos humildes. Aliás, em sua boca, essas palavras deixavam de ser ‘chavão’ para adquirir força e boniteza de poesia.

Na entrevista, retomando o final da música: “La copla no tiene dueño / patrones no más mandar / la guitarra americana / peleando aprendió a cantar”, ela confirmou:

- É isto. Foi lutando que a guitarra americana aprendeu a cantar. Sinto que o meu trabalho de artista cresce à medida em que me posiciono ao lado dos explorados”.

Diante de nossa insistência com o movimento indígena, ela responde:

- Acho correto lutar pelo direito de cada povo expressar sua cultura. Contudo, devemos ter cuidado, isso não pode ser usado para a desunião dos povos da América. Sempre lutei pela unidade, primeiro da Argentina e, depois, da América Latina. O homem amazônico é meu irmão, sofre a mesma opressão que o homem da minha província de Tucumán. Os povos indígenas do Brasil devem aprender português, é uma forma de se defender. Devem aprender a somar, dividir, enfim, certas coisas necessárias à sua sobrevivência como povo numa sociedade como a que vivemos”.

En la mierda

O outro jornal alternativo que paparicou Mercedes Sosa foi A Lucta Social (Manaus, maio de 1980, Ano I, nº 4), com a seguinte manchete: Mercedes Sosa: com o PT e com os que vivem ‘en la mierda’. 

O texto de abertura também puxou a brasa para o nosso jaraqui: “Na entrevista, Mercedes se solidarizou com a greve dos metalúrgicos do ABC paulista e com o PT. Manifestou apoio à luta dos trabalhadores na Argentina e o compromisso que todo artista deve ter com os que vivem ‘en la mierda’”.

O jornal, envolvido pelo clima de greves de São Paulo, noticiou o show de forma panfletária: “O público vibrou quando ela interpretou ‘La Carta’ da chilena Violeta Parra. A letra registra a notícia do irmão preso por apoiar uma greve, e conclui: “Por suerte tengo guitarra / y también tengo mi voz / también tengo siete hermanos / fuera del que se engrilló / todos revolucionários / con el favor de mi Dios”.  

Mercedes eximiu-se de discutir a situação interna do Brasil, mas por analogia acabou se manifestando, quando denunciou a repressão ao movimento operário na Argentina. Elogiou Chico Buarque e Milton Nascimento, “por causa do show que deram para arrecadar fundos para os grevistas do ABC”. E deu uma risadinha irônica, ao saber da afirmação de Paulo Maluf de que os salários dos metalúrgicos paulistas eram elevados.  - “Mentiroso!” – ela disse.

Fizemos uma pergunta provocadora:

- Mercedes, um jornalista amazonense, malufista, criticou você por estar hospedada num hotel de luxo como o Tropical.

Ela rebateu:

- Isto é só um pretexto. Na verdade o que ele está criticando é o meu compromisso político, o que ele ataca são as propostas de transformação da sociedade. Nós, artistas, somos trabalhadores das artes, alguns bem pagos, sem que isso mude o nosso compromisso com as lutas populares por melhores condições de vida.

Tristeza y penas en mi alma...Ay mi paloma, sin esperanzas!. Às vezes, teu canto parece amargurado, como em Zamba del Regreso. Afinal, existe esperança?

- Apesar de tudo, ou ‘apesar de você’, como canta Chico Buarque, há sempre esperança. Nos olhos dos jovens está a vontade de transformação. Vocês me disseram que consideram uma façanha lotar o Teatro Amazonas sem qualquer publicidade. Acontece que as pessoas estão acordando. A música, sozinha, nada transforma, mas pode contribuir no processo de despertar. Ontem, no show, eu disse que é preciso cantar canções que façam dormir as crianças e despertar os adultos”.

Três meses após a entrevista, num golpe de sorte, eu e Marilza Mello encontramos Mercedes Sosa em Paris, num jantar oferecido pelo pintor argentino Luis Felipe Noé, amigo do poeta Thiago de Mello. Mercedes lembrava com alegria e bom humor do dia em que cantou no Teatro Amazonas. Depois disso, La Negra continuou pelo mundo“andando y cantando que es mi modo de alumbrar”.

Agora a cantora de milongas, de chacareras, de zambas, de cuecas, de todos os ritmos americanos, “perdida en las cerraciones” nos deixou, quien sabe, vidita, por donde andará?”. Seus admiradores cantaram ‘luna tucumana´ na hora em que dela se despediram: “Ay lunita tucumana, tamborcito calchaqui. Más cuando salga la luna, cantaré, cantaré”. 

“Su canción es simiente, es de barro y de cielo, es semilla y espiga, es futuro y recuerdo”. Talvez, por isso, algumas pessoas que lotaram o Teatro Amazonas há quase trinta anos, alumbradas por seu canto, possam entoar hoje as palavras que ela dedicou a Alfonsina: “Sabe Dios qué dolores viejos calló tu voz. Te vas, Alfonsina, con tu soledad; Qué poemas nuevos fuíste a buscar?” 

No ‘zamba para no morir’, ela profetiza: “No me asusta la muerte ritual, sólo dormir, verme borrar. Una historia me recordará siempre. Veo el campo, el fruto, la miel, y estas ganas de amar. No me puede el olvido vencer”. Pedimos emprestados os versos de César Vallejo, poeta que ela amava, para dizer que as imagens de seu velório transmitidas pela tv mostraram que “su cadáver estaba lleno de mundo” .

 

EL DÍA EN QUE MERCEDES ENCANTÓ MANAOS

Mayo de 1980. La cantante Mercedes Sosa pasa semi incógnita por Manaos, se hospeda en el Hotel Tropical y acaba dando un show, que no estaba programado, en el Teatro Amazonas. Nos concede una larga entrevista a mí y a Natacha Andrade, entonces una estudiante de periodismo. Seleccionamos el contenido y publicamos una parte en el  Porantim, periódico “en defensa de la causa indígena”, y la otra, en el periódico A Lucta Social, del Partido de los Trabajadores (PT-Amazonas), ambos editados por este locutor que les habla.

Fue de casualidad que supimos que Mercedes Sosa estaba en Manaos. Quien nos avisó fue uno de los choferes del Hotel Tropical, cuya lucta por un piso salarial fijo de 8 mil cruzeiros había recibido el apoyo del PT local, a fines de abril. La cantora vivía, en aquella época, en Paris, exilada en función de la persecución de la dictadura del general Videla. Escogió Manaos para descansar de una excursión artística y conocer un poco la Amazonía.

El show en el Teatro Amazonas fue decidido de última hora, no hubo divulgación, a no ser la que se hace boca a boca en las salas de clase de la Universidad. Una mente abierta del gobierno Lindoso – no me recuerdo  bien si fue el poeta Élson Farias – nos facilitó los contactos institucionales para que nos cedieran el teatro. Lo cierto es que el día 6 de mayo, la gran intérprete de la canción latino-americana cantaba, con la casa llena, ingresos a precio popular de 100 cruzeiros (Ella rechazó una propuesta para cobrar 1.000 cruzeiros).

Murió el domingo pasado, en Buenos Aires. Mercedes Sosa tenía 44 años cuando pasó por Manaos, llena de exuberante creatividad, conservaba rara belleza otoñal, como muestra la foto del Porantim. Cantó músicas conocidas de su repertorio, dos de ellas en lengua Toba, un pueblo indígena de Argentina. Después del show, volvimos a conversar. Reproduzco trechos de la entrevista publicada en los dos periódicos que tengo archivados.

La mano al índio

 “Mercedes Sosa: Dale tu mano al indio” – ese fue el titular de página del  Porantim (Manaus, ano III, nº 19/20 junio/julio 1980), que llevaba la brasa para nuestra sardina, citando Canción para mi América - del uruguayo Daniel Viglietti cantada en el show del Teatro Amazonas: “Dale tu mano al indio / dale que te hará bien / y encontrarás el camino / como ayer yo lo encontré”.

Pero Mercedes no cayó en la trampa de particularizar la lucha: “Estoy cantando para que se extienda la mano no solamente al indio, sino al hombre de América Latina. Canto por todos los oprimidos, por los indios, por el trabajador, por la mujer, por el negro y por todos los marginalizados”. La cantante, desde el ‘Nuevo Cancionero’, de los años 1960, siempre mostró preocupación con la vida cotidiana de los humildes. Así, en su boca, esas palabras dejaban de ser ‘cliché’ para adquirir fuerza y belleza de poesía.

En la entrevista, retomando el final de la música: “La copla no tiene dueño / patrones no más mandar / la guitarra americana / peleando aprendió a cantar”, confirmó: “Es así.  Fue luchando que la guitarra americana aprendió a cantar. Siento que mi trabajo de artista crece a medida que tomo una posición al lado de los explotados”. Ante nuestra insistencia con el movimiento indígena, responde:

“Me parece correcto luchar por el derecho que cada pueblo tiene de expresar su cultura. Entre tanto, debemos tener cuidado, eso no se puede usar para la desunión de los pueblos de América. Siempre luché por la unidad, primero de Argentina y después, de América Latina. El hombre amazónico es mi hermano, sufre la misma opresión que el hombre de mi provincia de Tucumán. Los pueblos indígenas de Brasil deben aprender portugués, es una forma de defenderse. Deben aprender a sumar, dividir, en fin, ciertas cosas necesarias para su sobrevivencia como pueblo en una sociedad como la que vivimos”.

En la mierda

El otro periódico alternativo que lisonjeó a Mercedes Sosa fue A Lucta Social (Manaus, maio de 1980, Ano I, nº 4), con el siguiente titular: Mercedes Sosa: com o PT e com os que vivem ‘en la mierda’. El texto de apertura también lleva la brasa para nuestro pescado: “En la entrevista, Mercedes se solidarizó con la huelga de los metalúrgicos del ABC de São Paulo y con el PT. Manifestó apoyo a la lucha de los trabajadores en la Argentina y el compromiso que todo artista debe tener con los que viven ‘en la mierda’”.

El periódico, comprometido por el clima de huelgas de São Paulo, dio la noticia sobre el show de forma proselitista : “El público vibró cuando interpretó ‘La Carta’ de la chilena Violeta Parra. La letra registra la noticia del hermano preso por apoyar una huelga y concluye: “Por suerte tengo guitarra / y también tengo mi voz / también tengo siete hermanos / fuera del que se engrilló / todos revolucionarios / con el favor de mi Dios”.  

Mercedes esquivó discutir la situación interna de Brasil, pero por analogía acabó  manifestándose, cuando denunció la represión al movimiento obrero en Argentina. Elogió Chico Buarque y Milton Nascimento, “en virtud del show que dieron para recaudar fondos para los huelguistas del ABC”. Y soltó una discreta risa irónica, al saber que Paulo Maluf había afirmado que los sueldos de los metalúrgicos paulistas eran elevados.  - “Mentiroso!” – dijo.

Le hicimos una pregunta provocadora:

- Mercedes, un periodista amazonense, partidario de Maluf, te criticó porque estás hospedada en un hotel de lujo como el Tropical.

Su respuesta fue:

- Es solo un pretexto. En verdad lo que está criticando es mi compromiso político, lo que ataca son las propuestas de transformación de la sociedad. Nosotros, los artistas, somos los trabajadores del arte, algunos bien pagados, sin que eso mude nuestro compromiso con las luchas populares por mejores condiciones de vida.

- “Tristeza y penas en mi alma...Ay mi paloma, sin esperanzas!”. A veces, su canto parece amargado, como e Zamba del Regreso. Al final, ¿ existe esperanza? - insistimos.

- A pesar de todo, o ‘apesar de você’, como canta Chico Buarque, hay siempre esperanza. En los ojos de los jóvenes está la voluntad de transformación. Uds. me dijeron que consideran una hazaña llenar el Teatro Amazonas sin cualquier publicidad. Sucede que las personas están despertando. La música, por si sola, nada transforma, pero puede contribuir en el proceso de despertar. Ayer, en el show, dije que es necesario cantar canciones para que los niños duerman y que los adultos despierten”.

Tres meses después de la entrevista, por un golpe de suerte, Marilza Mello y yo encontramos Mercedes Sosa en Paris, en una cenar ofrecida por el pintor argentino Luis Felipe Noé, amigo del poeta Thiago de Mello. Mercedes recordaba con alegría y buen humor el día en que cantó en el Teatro Amazonas. Después, La Negra continuó por el mundo “andando y cantando que es mi modo de alumbrar”.

Ahora la cantora de milongas, de chacareras, de zambas, de cuecas, de todos los ritmos americanos, “perdida en las cerrazones” nos dejó quien sabe, vidita, por donde andará?”. Sus admiradores cantaron ‘luna tucumana´  en la hora de la  despedida: 

Ay lunita tucumana, tamborcito calchaquí. Más cuando salga la luna, cantaré, cantaré. 

“Su canción es simiente, es de barro y de cielo, es semilla y espiga, es futuro y recuerdo”. Tal vez, por eso, algunos de los que llenaron el Teatro Amazonas hace casi treinta años, alumbrados por su canto, puedan entonar hoy las palabras que dedicó a Alfonsina: “Sabe Dios qué dolores viejos calló tu voz. Te vas, Alfonsina, con tu soledad; Qué poemas nuevos fuiste a buscar?”  

En ‘zamba para no morir’, profetiza: “No me asusta la muerte ritual, sólo dormir, verme borrar. Una historia me recordará siempre. Veo el campo, el fruto, la miel, y estas ganas de amar. No me puede el olvido vencer”.

Con licencia de César Vallejo, poeta que ella amaba, usamos sus versos para decir que las imágenes de su velorio transmitidas por la tv mostraron que “su cadáver estaba lleno de mundo” .

Video da apresentaçao de Mercedes con Gal Costa, Chico Buarque, Caetano Veloso e Milton Nascimento :  https://www.facebook.com/photo.php?v=304053639733775&set=vb.100003874238494&type=2&theater

 

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