CRÔNICAS

Os amigos do Museu Maguta

Em: 21 de Abril de 1995 Visualizações: 1568
Os amigos do Museu Maguta

Quando a Amazônia não era ainda habitada por qualquer mortal, há milênios, o herói cultural Yoi foi pescar no Igarapé e Eware, no alto Solimões. Colocou isca de macaxeira ou de milho verde no anzol. Os peixes que mordiam a isca, logo se transformavam em gente. O primeiro povo pescado foi o Magüta.

Esse povo, pescado nas águas sagradas do Eware, é conhecido hoje como Ticuna e está espalhado por oito municípios desde Beruri até Tabatinga, na fronteira com a Colômbia e o Peru, totalizando mais de 28 mil índios com os dados de 1995.

Para que essa história nunca desapareça de sua memória, os Ticuna decidiram fundar em 1988, em Benjamin Constant, o museu Magüta. Quando a notícia se espalhou pelas 95 aldeias ao longo dos Solimões, eles começaram a produzir e a selecionar o que tinham de melhor para doarem espontaneamente ao museu: colares, redes, cestos, bolsas, esculturas, pinturas em entrecascas, máscaras rituais, arcos, flechas, panelas e potes de barro, conforme conta Jussara Gruber, assessora do Museu, em um belo artigo publicado no segundo número da revista Piracema, editada pela Funarte.

O Magüta foi inaugurado em dezembro de 1991. Atualmente possui mais de 600 peças, das quais 180 fazem parte da exposição permanente, todas elas registradas, fichadas e cuidadas pelo ticuna Constantino Ramos Lopes Füpeatucü, o primeiro museólogo indígena, responsável pela guarda do acervo e dinamização do Museu.

 Nesta Semana do Índio, Constantino foi convidado pelo sub-reitor de Assuntos Comunitários da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Ricardo Vieiralves, para ensinar um pouco do que sabe à Universidade e aos cariocas. Além da UERJ, onde falou para um público de 160 pessoas, Constantino deu verdadeiras aulas, lotando salas e auditórios do Museu Nacional, da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro e do Curso de Museologia da UNI-Rio. Na próxima semana, continuará discutindo o museu com a Universidade Federal Fluminense (UFF), com o Museu do Índio e outras instituições.

Em todas as Universidades, Constantino foi aplaudido com entusiasmo. Ele apresentou cem slides, descrevendo como o Magüta foi construído e como foi organizada sua exposição permanente, montada com recursos técnicos que podem ser encontrados nos melhores museus do País, com painéis e cubos de madeira trabalhada e vitrines para proteger os objetos menores.

No final de sua palestra, Constantino falou sobre o tipo de público que frequenta o Museu: uma média de 1.300 turistas estrangeiros por ano, vindos de mais de 40 países diferentes; brasileiros de todas as partes do País, população não-indígena de Benjamin Constant e Tabatinga - sobretudo alunos da rede escolar de ensino que frequentam a biblioteca do Museu, com acervo de mais de 2.500 livros, a maior do alto Solimões, além, finalmente, da frequência regular dos próprios Ticuna que se deslocam pela cidade.

Este Museu não recebe nenhuma ajuda governamental mas - como observa Jussara Gruber - permite introduzir as novas gerações formadas por alunos de escolas num universo antes ignorado, de beleza e criação. Agora começa a se articular para formar uma Associação dos Amigos do Museu Magüta, destinada a apoiar a manutenção e expansão das atividades desta instituição.

Metaforicamente, Magüta significa o povo que vai existir para sempre. Para sempre. Por todos os séculos dos séculos.

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1 Comentário(s)

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Ana Silva comentou:
29/09/2024
Adorei! Excelente crônica sobre o primeiro museu indigena do Brasil.
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