CRÔNICAS

Dona Waldenora, Zé Melo Merenda e outros bichos

Em: 29 de Janeiro de 1996 Visualizações: 19100
Dona Waldenora, Zé Melo Merenda e outros bichos

A única atividade exercida por certo colunismo social manauara é tomar o café da manhã com ‘socialaites’ e depois publicar as fotos. Só isso. A nossa coluna é diferente. Tomamos o café, mas fazemos outras coisas, ao longo do dia, com os nossos personagens, mesmo com o risco de ver invadida a nossa privacidade. Me dá a tua mão e me acompanha, leitor (a), nesta contraditória jornada.

Café da manhã

O café da manhã de hoje eu tomo com a minha amiga Waldenora de Oliveira Xavier, professora aposentada do Cônego Azevedo, no bairro de Aparecida. Uma das melhores alfabetizadoras que Manaus já teve, dona Waldenora dedicou sua vida às crianças de 1ª a 4ª série. Desembargadores, juízes, médicos, advogados, mecânicos, padeiros, funcionários públicos e até vendedores de túmulo foram seus alunos. Ela é a-do-ra-da por muitos deles. Alguns, ainda hoje, lhe levam sempre uma lembrancinha no ‘ Dia do Professor’.

Terna e carinhosa com as crianças, ela vira uma onça braba diante da safadeza dos adultos. Desbocada, desbocadíssima, no bom sentido, quando é preciso, militante ativa da Associação dos Professores (APPAM) desde sua fundação, dona Waldenora – La Pasionária – vive as lutas do magistério com muita paixão, servindo de exemplo para todos os colegas. Está indignada. Enquanto devoro uma fatia de mamão no nosso breakfast,  ela me exibe o seu magro e anêmico contracheque.

- Babá, você tem que denunciar a mentira desses homens. O Zé Melo está mentindo. Os inativos e pensionistas não receberam o aumento anunciado. Defende a gente, Babá. Ultimamente, tou te sentindo muito vacilante. Os últimos ‘Taquiprati’ estão chochos.

O ex-bedel do Ginásio de Aparecida, meu amigo Paulinho Tripa, irmão do Rubem Rola, interrompe a conversa e confirma:

- É isso mesmo, professora.

Preocupado, penso: antes que os meus amigos de Aparecida me esfolem, eu juro que arranco o couro do Zé Melo Merenda, escalpelo a sua careca, mesmo simbolicamente. É o que vou tentar fazer agora, na minha segunda atividade do dia. O mamão começa a fazer efeito, peço licença e corro para o banheiro.

No banheiro

Minha ida matinal ao – com o perdão da palavra – vaso sanitário, faço em companhia do – com o perdão da palavra - José Melo, secretário estadual de educação. Sento no vaso e abro um jornal luxuoso, com impressão a cores, em papel couché liso e brilhante, editado pela SEDUC (ou seja, com o dinheiro do contribuinte, nossa grana) intitulado ‘Informativo da Educação’ (Ano I, nº 01 – Janeiro de 1996). Trata-se, na realidade, de propaganda disfarçada do candidato José Melo Merenda.

Leio o editorial ‘Valeu a pena esperar’, escrito pelo próprio secretário ou pelo menos por ele assinado, onde puxa o saco do governador Amazonino Mendes, esperando ser indicado por ele como candidato a prefeito de Manaus. A seção de humor é preenchida com um artigo muito, muito engraçado, assinado pelo próprio Amazonino, intitulado ‘Educação: a sustentação do 3º ciclo’. Pura bacaba. Ele termina com uma frase enigmática:

- O terceiro ciclo permitirá aproveitar a riqueza do nosso Amazonas de forma linear.

Ai eu me pergunto: que diabo ele quer dizer (ou esconder) com a expressão “de forma linear”. Eguate! Eu einh!. Se o Negão tivesse sido alfabetizado por dona Valdenora, ele não seria tão bacabeiro.

Sentado ainda no vaso, folheio a penúltima página: ‘ Merenda Escolar garantida para a capital e o interior’, onde o Zé Melo Merenda fala de cardápio regionalizado, com frutas do 3º ciclo. Nenhuma palavra sobre as sérias denúncias de desvio da merenda escolar feita pelo deputado Luís Fernando Nicolau-lau-lau-lau, bate-perna, bate-pau, quem quiser tomar mingau, vá falar com Nicolau.

Finalmente, meus olhos estarrecidos percorrem a manchete delirante da última página: “Professores do Amazonas terão os melhores salários do Brasil”. Só faltou gritar “sil sil sil”. Aqui, o Zé Melo aloprou e ofendeu os trabalhadores da educação. Um escárnio! Ele apresenta quadros que falseiam a realidade. Compara remuneração dos professores do Amazonas, acrescidas das vantagens e do salário-giz com o salário-base dos outros Estados, ocultando as vantagens que lá existem. O magistério amazonense está revoltado.

Zé Melo Merenda, com o Plano de Cargos e Salários, inventou uma tal de produtividade, que depende da arrecadação do Estado. No fim do mês, o professor pode ganhar mais ou pode ganhar menos. É um sistema que já existe há algum tempo na próprio Secretária de Fazenda (SEFAZ), cujos funcionários ganham sempre menos, porque os ‘homens’ manipulam os dados. Recentemente, expurgaram dos cálculos justamente os últimos dias de dezembro, quando aumentou a arrecadação. Quem me contou tudo isto foi o cunhado do Totôde, que é funcionário da Sefaz.

Depois de ler tanta mentira, amasso o jornal, que não teve sequer finalidades higiênicas, e puxo a descarga. Decido tomar banho.

No chuveiro

Saio do chuveiro com o Ronaldo Tiradentes no meu pensamento. Nas próximas eleições, a ‘Organização’ do governador Amazonino vai gastar muita grana. Por isso, uma comitiva paga pelo contribuinte viajou para Washington, onde foi pedir recursos ao Banco Interamericano de Desenvolvimento. Compreende-se até que Samuel Hanan o tenha acompanhado. Mas alguém aí da plateia pode me explicar que diabo o Alferes foi fazer lá?

Tiradentes só sabe dizer “gude naite”. E olhe lá! Por isso, levou um dicionário no bolso daquele casaco de abafar-banana com o qual apareceu na televisão local. Bateram na porta do seu quarto, no hotel. O Alferes consultou o dicionário e gritou: - Between. Ninguém entrou. Tornaram a bater. Nova consulta ao dicionário. “Devem ser mais de duas pessoas” – pensou o Alferes, gritando: - Among!!! Foi ele, o Ronaldo Toothpuller que traduziu “the boy is behind the door” como “o boi está berrando de dor”.

No táxi

Tomo um táxi para ir ao trabalho e dou carona para o pobrezinho do César Bonfim, que está roendo beira de penico. Tadinho dele! Cassado por corrupção, Bonfim foi nomeado assessor do IPLAN, com um salário de R$880,00; “Ele tem direito de recomeçar sua vida. Não posso demiti-lo, porque não recebi nenhuma queixa do presidente do Iplan” – diz angelicalmente o prefeito Eduardo Braga, que o contratou.

Que quié isso, prefeito? Tá pensando que a opinião pública é formada por um bando de idiotas, por Zé Mané? A gente, às vezes, até que acende umas velinhas para Santa Etelvina, mas assim também já é demais. Como o presidente do Iplan pode se queixar, se nem sabia que Bonfim era seu assessor? Bonfim não apareceu sequer um dia para trabalhar. Dono de um carrão importado, vive numa senhora mansão, não precisa desse dinheiro fácil, que para ele é mixaria. Acontece que Bonfim está tão acostumado a mamar nas tetas dos cofres públicos que ficou viciado, dependente, como um drogado. O Iplan, para ele, é como um pipo, uma chupeta para uma criança. Não sai leite, mas pelo menos ele não perde o hábito de mamar. Nota Zero para Eduardo Braga.

Almoçando

O meu almoço de hoje compartilho com Andreza Oliveira, humilhada por um casal de picaretinhas da Maternidade Santa Rita, por ser portadora de deficiência auditiva.

Para o meu jantar, convido o deputado Eron Bezerra, que vai mover uma ação popular contra o Estado do Amazonas, responsabilizando-o pelas mortes em hospitais e postos de saúde por falta de assistência médica. Quando o cabo Atchim Pereira assumiu a SUSAM, escrevi aqui que seria um desastre, porque ele não sabe distinguir um estetoscópio de um ‘colhão-de-bode’. O cabo demitiu os pediatras e deu no que deu. Vai fundo, Eron!

Minha sobremesa eu ia deixar para o Sujoé Cláudio de Souza, mas o espaço acabou. Fica pra próxima.

P.S. – Taí, querida mestra Waldenora. Taí Paulinho Tripa. Fiz o que pude. O resto é com a senhora. Divulgue.

 

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7 Comentário(s)

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Armando Barrella comentou:
28/11/2017
Dona Waldenora nao fora minha professora, mas era atuante, usava de amorevolezza e me cativou nos corredores do colégio. Professora das antigas como dona Geni Bandeira e Lindalva.
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celeste comentou:
05/04/2014
Para além de todas as contradições que essa "política" tenta nos enfiar goela abaixo, eu pergunto: Cadê os órgãos competentes que regulam essa vergonhosa propaganda feita de forma descarada por políticos,na mídia? Descarada porque é mentirosa(aqui em Minas Gerais a educação é de "primeiro mundo" com um piso salarial vergonhoso e manaus não é diferente), descarada porque é com o dinheiro do contribuinte, descarada porque é propaganda política feita fora do período estabelecido pelo TRE...enfim, completamente ilegal! E fica por isso mesmo? Onde estão as instituições competentes/ É a certeza da impunidade que faz com que esses políticos brinquem com a boa fé e com o dinheiro do contribuinte. E viva a grande D.Waldenora Xavier!!!
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Jairo Ferreira comentou:
12/05/2011
É meu querido Bessa, a determinante desta crônica que por sinal você descreve com tanta fluidez, é que pessoas que mamaram no governo naquela época e que hoje colhem os frutos desta passagem "honrosa" são as contradiçõoes que os mesmos exercem seja ela como empresários, os que aindam continuam la mamando ainda e aqueles que outrora faziam oposição (Eron, Vanessa) e que hoje tomam cafezinho da manha com os caras que estao neste governo desde meus tempos de Colégio Aparecida e isso vai desde 1981.
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Allan Gomes (Diario do Amazonas) comentou:
26/07/2010
Há 14 anos atrás ainda se poderia invocar o nome do Eron com orgulho, como defensor de algum ideal, como alguém que ainda tinha valores. Mas o poder é mais importante..o poder pelo poder.
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FabricioMenezes (diario on line) comentou:
20/06/2010
Legal…rs,rs,rs,rs,rs… Continua atualizado o tema…e quem diria…recuperando a memoria social encontramos estas mesmas figuras (acho que o cesar bonfim sumiu)…mamando das tetas do governo…ZE MELO demonstrou em reportagem… preocupação, ansiedade com o poder (ser vice-ativo)disse ele na entrevista. RONALDO TIRANDENTES agora e empresário…poderoso… ERON BEZERRA…como mudou…em nome do partido diz ele
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ciro braga dantas comentou:
17/06/2010
eron, o pc do b de forma geral, o sindicato dos professores com esse aumento "glorioso" de 4,8%, aumento em assembleia defendido pelos representantes do sindicato em ridículos 10%...
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lan Gomes comentou:
12/06/2010
9 de Junho de 2010 ás 19:30 Há 14 anos atrás ainda se poderia invocar o nome do Eron com orgulho, como defensor de algum ideal, como alguém que ainda tinha valores.Mas o poder é mais importante..o poder pelo poder.
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