.- Onde está o Rei dos Judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo.
A pergunta foi feita pelos reis magos à pessoa errada, justamente a Herodes, que os enviou a Belém. Segundo a tradicional versão popular, os três reis magos – Baltazar, Gaspar e Melquior – saíram, então, à procura do novo rei. Caminharam pelo deserto guiados por uma estrela. Encontraram no dia 6 de janeiro o estábulo com a manjedoura. Ofertaram ouro, incenso e mirra ao menino Jesus como sinal de reverência. É o que nós sabemos desde criança.
O mundo cristão comemora amanhã o Dia de Reis, sem muito entusiasmo. A figura dos Reis Magos é um símbolo da tradição cristã cada vez menos festejado, que representa a multietnicidade do Oriente Médio. Justamente eles, que são os responsáveis pela instauração da oferenda natalina, hoje vulgarizada como troca-troca de presentes.
Por isso, em alguns lugares da Europa a oferta de presentes se fez e ainda se faz no dia 6 de janeiro e não no 25 de dezembro, data em que se comemora o nascimento, mas não a oferenda. Tanto a substituição das datas quanto a troca de personagens – São Nicolau ou Papai Noel em lugar dos Reis Magos – se deve a uma bem montada campanha de marketing anglo-saxão com raízes nórdicas.
Em alguns lugares a data é ainda lembrada com festividades populares, como a Folia de Reis, com doces como o bolo-rei, mas nada que recupere a simbologia da generosidade e da coragem desses representantes de diversas etnias em exemplar e harmônico convívio, enfrentando as iradas ameaças de um Herodes que iria arrasar com um genocídio parecido ao de qualquer guerra fratricida exibida em telejornais.
Em Portugal, neste dia todas as padarias vendem o famoso bolo-rei, contendo em seu interior um presente muito disputado pelas crianças no momento de cortá-lo e dividi-lo. Em geral, trata-se de um pequeno objeto, cujo valor lúdico reside justamente na surpresa de encontrá-lo dentro da fatia do bolo.
No Amazonas, e mais particularmente em Manaus, a colônia portuguesa, através do Clube do Luso, encenava anualmente “As Pastorinhas”, de forte apelo popular, com os principais personagens percorrendo as ruas do centro e de alguns bairros, em carro aberto, com destaque para o famoso “Cão do Luso”, que na década de 1950 era representado por João Bosco Araújo, hoje professor de filosofia na universidade. Ele era o terror das crianças.
O poeta Thiago de Mello, em seu belo livro “Manaus, Amor e Memória”, lembra que esta celebração profana e lírica do nascimento de Jesus “reunia as figuras dos anjos (com suas asas de papel crepom), da estrela, da cigana, das borboletas, do pastor-guia, da Diana, além das numerosas pastoras. Tinham o seu lugar fixo, não saíam e sempre havia um presépio na casa onde cantavam”.
Eram conhecidas as Pastorinhas de Parintins. O poeta cita ainda as Pastorinhas do Educandos, mas testemunha que nenhuma teve mais fama do que as do Luso, que se apresentavam num palco com momentos de espalhafato cênico, como aquele em que surgia a figura toda vermelha do Diabo, envolto em chamas, espalhando cheiro de enxofre queimado, saindo de um buraco do palco, num salto acrobático,.
- O Diabo tinha bigodes de português e era com a prosódia carregada que ele exclamava diante do Anjo que surgia para vencê-lo: até o anjo Gabriel me tenta””.
Existem muitas tradições populares como as “Pastorinhas” e a “Folia de Reis” que não podem ser esquecidas, porque nelas estão plasmados os nossos valores culturais e históricos.