.Todo ano, o bairro de Aparecida celebrava o sábado de aleluia, malhando um boneco de pano, pendurado num poste, em cujo bolso estava um testamento, escrito em versos, rindo de nós mesmos, de nossas misérias, desgraças, aflições. O Edilson, filho da dona Pequenina e do Marcolino, com seu talento de poeta popular, redigia cada estrofe sem um verso de pé-quebrado, apesar de sua gagueira. A ele, à sua genialidade, dedicamos esse testamento, escrito em co-autoria com o marido da Rosilene, genro da Maria Edina, de quem roubei a rima e pedi emprestado a veia poética nordestina. Taí pra vocês.
1. Meu nome é Iscariote
ou Judas, se preferir.
Tô preso pelo cangote
num poste fazendo rir.
Já vou abrir meu pacote
e os brindes distribuir.
Vão todos nesse momento
conhecer meu testamento.
2. Os Jardins da Babilônia?
O Farol de Alexandria?
As florestas da Amazônia?
A Catedral de Sofia?
O F-3 do Pizônia?
Não passam de mixaria!
Para o Nininho - adivinha? -
Taj Mahal é fichinha.
3. Deixo ao filho de Satã,
ao barão de Eirunepé,
a mansão do Tarumã,
com cascata e igarapé,
uns troquinhos da Sudam,
prá construir um chalé.
Mas seu verdadeiro lar
é a casa do Ali Babá.
4. Pro Cabo Pereira, nada,
nem tucumã, nem pupunha.
Da sua puxa-sacada,
Eduardo é testemunha.
Não chega nem a anspeçada,
é mais ruim do que eu supunha.
Deixo só uma indagação:
E o IPTU do patrão?
5. Pro ex-tucuxi Gilberto
(de acordo com meu estudo,
o blefe do "Rumo Certo"
é o responsável por tudo),
pra manter sua obra perto,
deixo um penico parrudo.
Ao Klinger, xerife irado,
lego um sutiã blindado.
6. Deixo pro Arthur, meu cliente,
que ia ser embaixador,
mas foi prefeito e está crente
que vai ser governador,
uma faixa de presidente,
talhada em papel de cor.
Papagaio de tucano,
não vira galo, seu mano!
7. Canário que muito canta
costuma borrar o ninho.
O Lupércio - que garganta!
Quer o lugar do Nininho.
Deixo-lhe um crânio de anta,
que encaixa bem direitinho
em seu pescoço, ora pois,
por serdes vós o que sois.
8. Ao Cabral, uma barba azul,
Ao Silas, uma gorjeta,
Pro Peres, um pitbull,
Pra Vanessa, uma escopeta.
Ao Nicolau de Istambul
pra mamar, uma teta.
E para o Mário (Qual Mário?)
Se é o Frota, aquele armário.
9. Para o ex-quase integrante
de um Tribunal federal,
deixo um lugar importante
num júri de carnaval,
ou pra julgar debutante
no Rio Negro ou no Ideal.
Tem outros cargos afins,
lá dentro do tribulins.
10. Pro Cláudio e Euler Ribeiro
que estão fora da boquinha,
eu deixo um mandato inteiro
pra disputar na porrinha.
Quem ganhar será enfermeiro
lá na Bósnia Herzegovínia.
Pro Pauderney, um machado,
que só tora pau-mandado.
11. Deixo ao Zé Melo Merenda
uma banca de tacacá,
um bar, um ponto de venda,
pra ele gerenciar.
Pro Daniel, pra revenda,
estou deixando um alvará.
Mas tire xerox, pois
pode precisar depois.
12. E agora que lembrei disto,
para um tal de Carijó
que quando eu entreguei Cristo,
três vezes cantou em dó,
deixo um rap que é só isto:
"Co-co-co-co-co-ri-có
Ninguém sabe, ninguém viu
o IPTU que sumiu".
13. Pro Berinho Marmelada,
deixo pronta a portaria,
nomeando a cupinchada,
o sobrinho, a prima, a tia,
o compadre e a cunhada
pra prestar assessoria.
Nem é preciso ter vaga,
pra isto está a Turisbraga.
14. Pro paideguíssimo reitor
da UEA, no momento,
contratando professor
com estranho regimento,
monto um curso de doutor
na costa do Varre-vento,
mestrado em Janauacá
e o resto em qualquer lugar.
15. E pro Hidembergue, coitado,
no dia em que assumir
vai ver o péssimo estado
da nossa UA pós-Walmir,
deixo um débito atrasado,
mil sucatas pra gerir
e um indicativo de greve
para estourar muito breve.
16. Pro Acre, que agora quer
município que não é seu,
no caso de Eirunepé,
aqui vai palpite meu:
Eu concordo e boto fé,
se levar quem lá nasceu.
Vai ser fácil se enturmar,
o Cameli mora lá.
17. Nem toda notícia é boa:
é dengue, é pneumonia.
Nem todo pau dá canoa:
alguns dão blenorragia.
Nem toda barata voa:
mas o mosquito assovia.
Fica o "Aedes" com a Sesau
e o "Aegypti" com o Tropical.
18. Pro Eduardo, Serafim
e pro Marcos, bons sujeitos,
que gastaram o seu latim
e não foram nunca eleitos,
pelo não e pelo sim,
para os futuro pleitos,
deixo uma urna emprenhada
com os votos da cabocada.
19. Pro Lauria, o procurador,
deixo um binóculo potente,
que tenha retrovisor,
pra não olhar só pra frente
ao processar com rigor
os que estão roubando a gente.
Mão-de-pilão, como dói!
Já andaram por Niterói.
20. Se do inferno estou nas malhas
por ter sido um traidor,
bem antes de minhas falhas,
fui de Jesus seguidor.
Agora, livre das tralhas,
vou pedir para o Senhor:
Quero alguns desses um dia
pra me fazer companhia.
P.S - Judas estava presente quando Jesus transformou água em vinho nas bodas de Canaã. Mas o milagre que ele não viu é recente: os franceses, das 'Aguas do Amazonas", magicamente, sumiram com a água na região mais rica do planeta em recursos hidrográficos. Ai que saudades da Cosama! A Companhia de Lyon ri da gente, cantando: "Au clair de la lune, j'ai pété dans l'eau. Ça faisait des bulles, c'était rigolo".