A Polícia costuma construir retratos falados de ladrões de galinha, mas quase nunca daqueles que usam terno, gravata e colarinho branco. Pensei em fazer uma crônica, com o retrato falado do deputado Cordeirinho, em homenagem à Operação Albatroz, coordenada pela Polícia Federal no Amazonas, que conseguiu, pelo menos, transferir as fotos de alguns delinquentes das colunas sociais e da editoria política para a página policial dos jornais.
Acabei mudando de ideia. Prefiro apresentar hoje o retrato falado de um candidato nessas eleições municipais. Como a sua imagem aparece na mídia todo santo dia, espero que o (e) leitor o reconheça, de acordo com as características aqui apresentadas, em oito parágrafos. Quem acertar antes de ler o oitavo parágrafo, ganha de prêmio uma viagem de ida para Eirunepé. Anota aí:
1) Trata-se de alguém cujo nome – bem, não vale dizer o seu nome agora – mas podemos adiantar que ele incorporou na pia batismal o nome do Estado em que nasceu. O seu sobrenome começa com a letra “m”. Quando se apresenta e diz seu nome completo é obrigado sempre a pronunciar a sílaba “má”, indicadora das estripulias que ele vive armando, armando mesmo. O leitor se equivocou, se enquadrou apressadamente aqui o combativo e honrado companheiro Herbert Amazonas Massulo, do PSTU, da mesma forma se pensou em José Riograndino Marques, candidato do Prona a prefeito de São Borja, no Rio Grande do Sul. Recomendamos que prossiga a leitura do retrato falado para descartar essas duas hipóteses.
2) Não se trata nem do bom Herbert, nem do folclórico Riograndino, porque eles não foram duas vezes prefeito da capital, como o nosso candidato em questão. A pessoa de cujo retrato estamos falando governou a cidade em duas ocasiões, mas em vez de cuidar dos problemas dos moradores pobres, filosofou: “égua, farinha pouca, meu pirão primeiro”. Aí, usou o cargo pra se arrumar na vida. Enquanto milhares de eleitores vivem em favelas, em situação de extrema miséria, numa sociedade exacerbadamente pobre, ele mora numa mansão escandalosamente rica, cinematográfica, tipo casa da Dinda, numa região nobre da cidade, com piscina climatizada, jardins, quadra de esporte, pista de Cooper, suítes, salões de jogos e de festas, e oscambau a quatro.
3) Esse fato, por si só, serviria para desmascará-lo. No entanto, muita gente não vê o que aconteceu, porque ele contratou marqueteiros e montou uma poderosa e bem azeitada máquina de propaganda para esconder da população os procedimentos usados na construção de sua fortuna pessoal. Foi, além de prefeito, governador do Estado, realizando obras públicas vistosas, de fachada, o que lhe permitiu aparecer como alguém que trabalha muito e por isso vive sempre suado, alguém que arregaça as mangas, que constrói, que edifica, que faz e acontece. Aparece em várias fotos com capacete na cabeça, como um mestre-de-obras, no meio de tratores, construindo habitações populares. Sempre sorridente. Como ator, ele usa a máscara de empreendedor, de trabalhador, de realizador operoso.
4). Existem indícios veementes de que obras públicas que ele construiu foram hiper-super-faturadas. Vários documentos - com nomes, dados e assinaturas - comprovam remessa ilegal de dinheiro para paraísos fiscais, duvidosas operações de câmbio e depósitos milionários em contas no exterior. Os extratos bancários das remessas já foram fotografados e divulgados pela mídia. Existem denúncias do Ministério Público Federal contra ele, acusando-o de fraudes em licitações e remessa ilegal de dólares. Mas ele contrata advogados caros que impetram mandados de segurança, liminares, habeas-corpus, argumentando com muito latinorum que não existem provas, de acordo com a lex picaretorum. No horário eleitoral na televisão, para não perder o hábito, ele rouba a cena, e nega, nega sempre, nega tudo, nega em todo lugar, balançando a cabeça e jurando que os documentos são falsos, que a acusação é calúnia de seus inimigos políticos.
5) Muitas pessoas, inclusive personalidades públicas, sabem que ele está mentindo e admitem que é verdade tudo que aparece no parágrafo anterior – o saqueio dos cofres públicos. No entanto, combinam o parágrafo “c” – trabalho, trabalho e trabalho, com o parágrafo “d”, e aí revitalizam a antiga imagem do folclore político nacional: “ele rouba, mas faz”. Ressuscitam, assim, o cínico slogan populista de Ademar de Barros, velha raposa dos anos cinquenta. Tem gente que o admira, tem gente até que morre de inveja dele, considerando-o “muito esperto”, porque apesar de todas as evidências, a Polícia até hoje não conseguiu colocá-lo no xilindró. Ele não é cordeirinho. Ele é lobo.
6) Os adversários dizem que se ele ganhar a eleição para prefeito da cidade, não terminará esse terceiro mandato, porque vai usar a prefeitura para tentar voltar, mais uma vez, ao governo do Estado, candidatando-se nas próximas eleições daqui a dois anos. Quer usar a prefeitura como trampolim para um novo mandato de governador. Mas ele nega, nega sempre, nega tudo. Sempre balançando a cabeça. Jura – que Santa Luzia o cegue - que quer ser prefeito outra vez para trabalhar, para dar continuidade às suas obras, para atender mães pobres cujos filhos não tem alimento, para resolver os problemas de transporte e saúde (que ele não resolveu das vezes anteriores).
7) Falta ainda falar de sua principal característica, justamente aquela que permite dar o retoque final ao seu retrato. Com essa pista inconfundível, o (e)leitor o identificará imediatamente, se der de cara com ele numa esquina, num shopping qualquer, num comício ou até mesmo num out-door: ELE É UM TREMENDO CARA-DE-PAU. Os jornais baixam o cacete nele, os promotores esfregam provas de corrupção em sua cara, encontram recibos de depósitos nas Ilhas Jersey assinados por ele, o diabo a quatro. Mas o cara é sem-vergonha, continua impávido, como se não tivesse nada a ver e ainda se diz perseguido político. Reclama, com seu carregado sotaque paulistano, de filho de imigrante libanês: “Quem descobrir conta minha no exterior, pode ficar com o dinheiro”.
8) - Êpa! Peraí! Ilhas Jersey? Dessa eu não sabia. Filho de libanês? – pergunta o (e) leitor, mergulhado em grande confusão.
Realmente, ele é especialista em confundir os eleitores. Esse Paulo Salim Maluf, candidato a prefeito de São Paulo, não tem jeito não. (Enganou-se quem pensou em Amazonino? .
P.S. - Lula foi eleito e assumiu a presidência há 613 dias e até hoje não homologou a Terra Indigena Raposa Serra do Sol, conforme promessa feita durante a campanha eleitoral.