JORGE VIANA VIROU GRÃO DE MILHO NO PAPO DO PRESIDENTE DO SENADO
Por pouco o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-vixe, vixe!), não foi preso. Escapou por um triz. Na véspera de natal, ele fez um pronunciamento em cadeia nacional. Se fosse na cadeia nacional, estaria até agora trancafiado no Presídio da Papuda, em vez de ficar usando a rede de rádio e televisão em beneficio próprio. A simples contração da preposição com o artigo definido mudaria os destinos do país. O Brasil seria outro.
O discurso delirante do Renan, que durou apenas cinco minutos, foi suficiente para traçar um retrato da vida política brasileira e mostrar o grão de milho no papo da galinha. Mas quem não confrontou o dito com o feito, o discurso com a realidade, não entendeu bulhufas. Com a defesa verbal da decência, da moralidade e da transparência, Renan estava debochando de todos nós?
Quem ouviu e compreendeu o cinismo atroz de Renan foram os surdos, graças à Thamsanga Jantjie, aquele intérprete que atuou no funeral de Mandela e que foi convidado pelo Taquiprati para traduzir Renán na Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Voo do implante
O presidente do Senado começou o discurso elogiando sua gestão marcada - imaginem! - "pela transparência e pela ética". Com a maior cara de pau, lembrou as manifestações de junho passado, quando mais de um milhão de pessoas, numa demonstração de cidadania, foram às ruas exigir melhores serviços na área de saúde, educação e transporte publico.
A fala traduzida por Thamsanga, com ajuda do Dicionário de Libras, permitiu ler nas entrelinhas o que disse Renan:
"Ouvi a voz das ruas. Tivemos avanços na saúde, mormente no campo da alopecia. Já aparecem os primeiros resultados. Um paciente atacado de seborreia e pediculose, com perda de pelos no couro cabeludo e no púbis, se recuperou depois de cirurgia de implante capilar no Hospital Memorial São José, em Recife. Foram mais de 10 mil fios de cabelo e de pentelhos implantados pelo cirurgião Fernando Basto, especializado em fazer a cabeça de parlamentares, de arrepiar suas carecas e de otras cositas más".
O intérprete da Língua de Sinais traduziu a parte em que o senador alagoano registrou notável melhoria no transporte de enfermos:
"Os jatinhos da Força Aérea Brasileira (FAB) foram usados outrora para atender interesses privados, como no caso recente do casamento da filha do senador Eduardo Braga (PMDB-AM, vixe, vixe), em Trancoso, na Bahia. Mas hoje tudo mudou, a transparência e o controle social ajudaram a corrigir erros, eliminar vícios e distorções. Hoje, embora o serviço ainda não esteja universalizado, os jatinhos servem de ambulância e transportam, com conforto e gratuidade, alguns pacientes em estado pré-operatório e pós-cirúrgico, como ocorreu no caso da já citada cirurgia em Recife".
Dias antes desta apresentação em cadeia nacional, os jornais flagraram Renan usando jatinho da FAB para ir fazer implante capilar em Recife. Fotografado mamando com a boca na botija, ele consultou o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, para saber se houve alguma irregularidade. "Em caso afirmativo, o senador se compromete a devolver aos cofres públicos o dinheiro gasto no voo da FAB" - afirmou sua assessoria.
Milho no papo
O intérprete Thamsanga Jantjie traduziu a conclusão do que Renan falou ao povo brasileiro. Usou uma expressão bem conhecida: bateu com a mão esquerda espalmada sobre a mão direita fechada e fez como o fradinho do Henfil: top, top, top. Ou seja, em bom amazonês Renan deu um tremendo cotoco pra todos nós.
O presidente do Senado não ignora, evidentemente, o decreto presidencial 4.244, de 2002 que regulamenta o uso das aeronaves da FAB por autoridades que só pode ser feito "em três circunstâncias: por motivo de segurança e emergência médica, em viagens de serviço ou no deslocamento para seu local de residência fixa".
- Ele estava voltando para sua casa em Maceió, mas mudou de ideia e resolveu 'descer antes' em Recife - justificou correndinho o vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC), tentando com essa desculpa esfarrapada legalizar a mutreta do seu colega. Acontece que o relatório da FAB registra a solicitação do voo para Recife, que além disso está localizada depois de Maceió. Quando andava em companhia de Chico Mendes e de Marina da Silva, Jorge Viana era mais inteligente na defesa de causas mais nobres.
Renan, ex-chefe da tropa de choque de Collor de Mello, tem a folha corrida que tem: seis representações contra ele no Conselho de Ética, pedindo sua cassação, propina da empreiteira Mendes Junior que pagava 12 mil reais por mês à mãe do filho que teve fora do casamento, tráfico de influência junto a Schinchariol na compra de fábrica de refrigerantes, uso de notas fiscais frias em nome de empresas fantasmas, compra de rádios em Alagoas em nome de "laranjas" e por aí vai.
Jorge Viana é, até prova em contrário, um sujeito decente. Pelo menos era. Agora, ele nos engana, colocando seu passado decente a serviço da fina flor da malandragem, do embuste, da trapaça, do nepotismo, do compadrismo, da troca de favores, de tudo aquilo que representa o Brasil obscuro e atrasado.
O pior inimigo do grão de milho não é a galinha, que quando está fraca não pode atacar. É o outro grão de milho que está no papo dela, que está alimentando e dando forças a quem se prepara para atacar todo o milharal. Jorge Viana é o grão de milho no papo do Renan, fortalecendo quem ataca o povo brasileiro. Ele traiu o milharal. Quero que Santa Luzia me cegue se estou equivocado: pior do que Renan Calheiros é Jorge Viana. Um nos ataca, mas a gente já sabe quem é. O outro, em quem confiávamos, nos engana.