CRÔNICAS

A embaixatriz Sônia Guajajara na TIME

Em: 29 de Maio de 2022 Visualizações: 5368
A embaixatriz Sônia Guajajara na TIME

“Quem lucra com o capitalismo é um trapaceiro, que rapidamente

se torna milionário” (John dos Passos, O Grande Capital,1936).

A Time foi e continua sendo uma revista deles. Deles que eu digo é do grande capital financeiro que, em companhia de parte da mídia brasileira, há quatro anos apoiou a eleição do Coiso - um Zé Ruela - sob a garantia de o Ministério da Economia ser entregue ao Chicago Boy Paulo Guedes, que havia estagiado no Chile de Pinochet. The right man in the right place.

Por que então uma revista, que joga no time DELES, entrevistou Lula com foto na capa apresentando-o como “o líder mais popular do Brasil”? E agora escolhe Sônia Guajajara, gente NOSSA, como uma das 100 pessoas mais influentes no mundo em 2022. Seria Sônia the right woman in the wrong place? Mudou o Natal ou mudei eu?

Se a Time fosse “comunista”, nem precisava explicar. Mas é o contrário disso. Por que então não colocou o Coiso na capa de uma de suas edições? Por que não incluiu no rol dos influentes algum dos quatro zeros, um deles ex-quase-futuro embaixador do Brasil nos Estados Unidos? Afinal, na lista dos selecionados não há apenas santos, figuram também bandidos.

É que a revista constatou que a família Coiso, embora de direita - o que agradava os editores – é composta por um conjunto de zeros à esquerda - o que os torna inúteis na defesa dos interesses do capital. A má gestão do Zero-Mor evidenciou sua incompetência em atender as exigências do mercado.

Até mesmo o capitalismo selvagem tenta guardar as aparências, exigindo um mínimo de compostura, o que falta ao despreparado Coiso, cujo discurso negacionista defende a barbárie. “A vacina pode causar aids” – ele garantiu no momento em que o mundo lutava contra a covid-19. Somam-se a isso as boçalidades truculentas sobre clima, Amazônia, garimpo, homossexuais, mulheres, índios, quilombolas, liberação de armas, racismo, ataque às urnas eletrônicas – as mesmas que o elegeram junto com os três zeros rachadinhas.

Sinfonia americana

Não foi o inútil do Coiso que a mídia ajudou a eleger, mas o Paulo Guedes, fiel escudeiro do Mercado. Tal situação nos remete ao romancista estadunidense John dos Passos, autor de “O Grande Capital” – uma “sinfonia americana”, que retrata a hegemonia do capital monopolista e traz a biografia de personagens pobretões de origem humilde como Sônia e Lula.

Dois brasileiros figuram na lista das personalidades que mais influenciaram a vida no planeta em 2022: além de Sônia Guajajara, o pesquisador Túlio de Oliveira, diretor de Centro de Inovação Epidemiológica da África do Sul, que faz parte da equipe responsável pela detecção da variante Ômicron da Covid-19. Ambos selecionados como pioneiros contribuíram efetivamente para debater e esclarecer graves problemas que afligem a humanidade.

Os dois estão na companhia de 98 personalidades distribuídas em seis categorias: artistas, inovadores, titãs, líderes, ícones e pioneiros. Entre os líderes aparecem Zelensky, presidente da Ucrânia, Putin, presidente da Rússia, Gabriel Boric, presidente do Chile, além de Ketanji Jackson, a primeira mulher negra nomeada para a Suprema Corte dos Estados Unidos.

- “É uma enorme honra estar com a líder indígena, Sônia Guajajara, na lista dos 100 mais influentes da revista Time. Vamos trabalhar para um Brasil melhor que respeite a ciência, a vida, a população indígena e a natureza” – publicou Túlio no Twitter.

Mãe de três filhos - Mahkai, Yaponã e Y’wara – Sônia encontrou tempo para participar de várias frentes de luta, que a tornaram conhecida dentro e fora do movimento indígena. Durante seis anos, dirigiu a Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (COAPIMA), foi vice-presidente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e se tornou coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

Consolidou projeção nacional ao ser ovacionada, em dezembro de 2015, por cerca de 1500 indígenas de 139 etnias participantes da I Conferência Nacional de Política Indigenista em Brasília. Na ocasião, cobrou com sucesso da presidente Dilma uma posição contra a PEC 215 que inviabilizava a demarcação das terras indígenas.

A nossa embaixatriz

Depois disso, Sônia coorganizou a Primeira Marcha das Mulheres Indígenas em Brasília, em 2019, durante a qual foi criada a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA). No mesmo ano liderou a Jornada Sangue Indígena Nenhuma Gota Mais, que percorreu 12 países da Europa, denunciando violações cometidas pelo Governo do Coiso. Integra ainda o Conselho da Iniciativa Inter-religiosa pelas Florestas Tropicais do Brasil, iniciativa de um Programa da ONU.

Como nossa embaixatriz, ela já percorreu mais de 30 países, levando sempre um discurso em defesa da floresta, das culturas e línguas indígenas e da vida. Em 2008, participou do Fórum Permanente da ONU, em Nova Iorque, onde defendeu que “o centro do mundo é a Amazônia, pois se acabarem com as nossas matas, riquezas naturais, não haverá Estados Unidos ou Nova Iorque que sobreviva”.

Ela nos representou em diversos eventos internacionais, entre os quais o corrido em Cancún, no México, em 2010, ocasião em que entregou pessoalmente o Prêmio Motosserra de Ouro à senadora Kátia Abreu, que presidia a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), acusada por ambientalistas de querer detonar o Código Florestal.

Em defesa do meio ambiente, contra o desmatamento e a poluição dos rios, sua voz se fez ouvida no Conselho de Direitos Humanos da ONU e nas Conferências Mundiais do Clima (COP) de 2009 a 2017, além de ecoar em outros órgãos e instâncias internacionais, entre elas o Parlamento Europeu.

Suas críticas à política indigenista e ambiental do Governo Federal feitas em um documentário amplamente difundido no Brasil e no exterior fizeram com que fosse intimada pela Polícia Federal a prestar depoimento. Esse claro ato de censura foi arquivado por falta de consistência jurídica.

No texto para a revista Time sobre a trajetória de Sônia Guajajara, Guilherme Boulos destacou o fato de que Sônia, filha de pessoas iletradas, teve que sair de casa aos dez anos de idade para trabalhar, mas conseguiu se formar em uma universidade, desafiando as estatísticas.

Quer mais ou é suficiente para perceber que a revista reconheceu essa influência de Sônia Guajajara na discussão que rola no mundo? Ali onde se extermina índios, pretos, quilombolas e pobres, ali onde se queima a floresta e se mata os rios, ali onde agentes da Polícia Rodoviária Federal pagos pelo contribuinte torturaram e assassinaram Genivaldo, que era de Jesus e de todos os Santos, ali ecoa a voz de Sônia Guajajara ouvida nos cinco continentes. Ela, Ailton Krenak, David Yanomami nos representam.

Dezembro de 2015. Brasília.  Conferência Nacional de Política Indigenista. 

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22 Comentário(s)

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Ademario Souza Ribeiro comentou:
03/07/2022
Conheci a Sônia Guajajara em Porto Seguro ainda novinha e já na militância das Causas Indígenas. Era um ser de cuidado com o outro, simples, atenciosa. Passamos a nos corresponder - compartilhando textos e pensamentos acerca das línguas indígenas e das tantas labutas. Aquela mocinha (kunhãtaí) se autoconstruiu numa Kunhã-Yawareté (Mulher-Onça) em defesa dos Povos Originários! Quanta alegria! Quanta honra! Professor José Bessa, îandé abaeté, mboesara berab, kuekatureté! (nosso homem ilustre, professor brilhante, muito obrigado!).
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Luiz Pucú comentou:
02/06/2022
Putamerda Pajé! Ao ler-te sempre floresce na minha pessoa uma antiga vontade de conspirar e sair na porrada. O Mei Eu Interior, ANARTISTA por convicção e por ter mamado numa onça , ao ver a capa do Time - te juro - me emocionei... Nossa parenta Pajé...guerreira que nem nós..
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Patricia Galvão comentou:
31/05/2022
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Alceu Castilho comentou:
31/05/2022
Não basta elegermos outro presidente. A luta contra possíveis golpes (e contra as destruições do governo Bolsonaro) passa diretamente pela punição de cada um dos líderes fascistas. Nacional e internacional.
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Elson Melo comentou:
30/05/2022
José Bessa, a Sônia é Federal pelo PSOL São Paulo. Tamo Junto!
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Cláudia Travassos comentou:
30/05/2022
Grande destaque para Sonia Guajajara, excelente matéria.
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Renato Amram Athias comentou:
30/05/2022
Bessa, muito legal o texto. Gostei da maneira como você coloca a guerreira Sônia na Times100. Nas vezes que encontrei com a Sônia, tive a oportunidade de sentir o seu protagonismo.
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Magela Ranciaro (via FB) comentou:
29/05/2022
Excelente… sim, ela nos representa!!!
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Renato Athias comentou:
29/05/2022
Bessa, muito legal o teu texto. Gostei da maneira como você situa a guerreira Sônia na Times. Nas vezes que eu a encontrei tive a oportunidade de sentir o seu protagonismo.
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Eunice Dias de Paula comentou:
29/05/2022
Perfeita esta crônica, como todas de sua lavra, prof. Bessa.
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Tânia Pacheco comentou:
29/05/2022
PUBLICADO EM COMBATE - RACISMO AMBIENTAL - https://racismoambiental.net.br/2022/05/29/a-embaixatriz-sonia-guajajara-na-time-por-jose-ribamar-bessa-freire/
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Martha Azevedo comentou:
29/05/2022
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Luciola Zvarick comentou:
29/05/2022
Texto forte! Coloca todos os pingos nos "is" sobre o Coiso e sua trempa de zeros à esquerda. Sonia Guajajara me representa!
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PauloTitiãh comentou:
29/05/2022
Vamos sim está luta da nossa grande querreira vamos fazer brilha com todos nós , O povo Pataxó Hãhãhãe abraço vc Sônia Guajuvira, As nossa Mulheres indígenas temos que ter uma grande repeito por todos nós de cada aldeia do nossos Brasil , Ass Alapity PauloTitiãh indígenas do povo Baená Gratidão minha guerreira
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Valter Xeu comentou:
28/05/2022
PUBLICADO EM PATRIA LATINA - https://patrialatina.com.br/a-embaixatriz-sonia-guajajara-na-time/
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Célia Maria comentou:
28/05/2022
Protagonismo. Representatividade indigena
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Zezé Weiss comentou:
28/05/2022
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Graciela comentou:
28/05/2022
Maravilha!!! Que orgulho!!!!!!!
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Toni Lotar comentou:
28/05/2022
É mesmo muito merecido esse reconhecimento da Time a guerreira Soninha Guajajara!
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Ana Silva Kariri comentou:
28/05/2022
José Bessa refletindo sobre isso também.Boa colocação. Meu respeito sempre pela sua fala
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Pablo Freitas comentou:
28/05/2022
Minha sede é dos rios A minha cor é o arco-íris Minha fome é tanta Planta flor, irmã da bandeira A minha sina é verde-amarela Feito a bananeira" Aldir Blanc / João Bosco / Paulo Emilio
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Celeste Correa comentou:
28/05/2022
Mano, a gente sabe quais os interesses que uma revista como a Time representa. A lista de pessoas escolhidas desde a sua criação tem nomes como Hitler e Stalin agraciados com a "honra" dessa escolha. Mesmo assim, não podemos desconsiderar o alcance a visibilidade da revista que tem a maior circulação do mundo para uma revista semanal de notícias e tem um público de 26 milhões de pessoas. Ou seja, é uma vitrine para o mundo . E principalmente nesse momento difícil que o Brasil atravessa, a Sônia Guajarara estar na lista das 100 personalidades que mais influenciaram a vida no planeta em 2022 é de uma enorme importância não só para o Brasil, mas para todo o planeta. É importante que ela, que tem uma história de luta em defesa do meio ambiente, das culturas e línguas indígenas e da vida, dê visibilidade para o mundo da política predatória desse governo.
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