CRÔNICAS

O Velho Senado e o Novo Covil

Em: 28 de Junho de 2009 Visualizações: 8370
O Velho Senado e o Novo Covil

“O diabo sabe das coisas não por ser diabo, mas porque é velho”. Esse ditado popular considera que as pessoas de idade acumulam vivências, experiências e conhecimentos e que a velhice condensa sabedoria, maturidade. Por isso, na Roma antiga, só quem fosse velho (‘senex’ em latim) e, portanto, sábio, podia pertencer ao Conselho de Anciãos, que era chamado de senado. Lá, usava seus saberes em prol do bem comum.

No Brasil, o Senado está repleto de velhos, mas eles não conseguiram ainda demonstrar sabedoria. A crise pela qual passa a instituição está revelando que, com raras exceções, o Senado aqui não é bem um Conselho de sábios, mas um clube de sabidinhos e espertalhões, um antro de safadezas e falcatruas. Tal imagem constitui um sério golpe à democracia, porque desacredita as formas de representação popular e mata as esperanças coletivas.

A fina flor da malandragem, do embuste e da trapaça está ali representada: Renan Calheiros, Romero Jucá, Collor de Mello, José Sarney e tantos outros comprometidos até o último fio do cabelo com o nepotismo, o compadrismo, o fisiologismo, o clientelismo e a troca de favores, práticas comuns no Brasil dos grotões e dos coronéis, que foi potencializada pela ditadura militar e se arrastou até os dias de hoje. Representam o Brasil obscuro, incompatível com a modernidade.

Em 1984, montaram um dos maiores trens da alegria, com a contratação de 1.554 pessoas, sem concurso público, diz-que para trabalhar na gráfica do Senado. Na lista de passageiros, Roseana Sarney, Agaciel Maia e uma penca de filhos, afilhados, cônjuges e parentes de 25 senadores. Na ocasião, o ato que efetivou os servidores não foi divulgado pela Casa. Depois, novos atos secretos nomearam mais afilhados, sob sigilo, nas presidências de Sarney e de Renan Calheiros. Parece até que eles leram o nome de Agaciel de trás pra frente e por isso estão vagando e andando para a lei.

Agaciel ao revés

O senador José Sarney (PMDB – vixe, vixe!), três vezes presidente da instituição, acabou sendo a figura emblemática do que existe de mais podre e abominável naquela Casa. Foi patética a sua fala, transmitida pela TV Senado, tentando explicar a contratação do mordomo de sua filha Roseana com um salário de R$12 mil. Gaguejou, mentiu, desafinou, tentando defender o indefensável – o loteamento familiar dos cargos. Tudo ali tinha a mesma autenticidade da cor de seus cabelos e de seus bigodes.

Dá pena ver esse homem de 79 anos, que já foi presidente da República, declarar que seu neto, José Adriano Sarney, mereceu explorar a mina de dinheiro do crédito consignado no Senado, porque “tem mestrado na Sorbonne e doutorado em Harvard”. Quem ele acha que convence? O que faz é aumentar ainda mais a raiva dos brasileiros desempregados e daqueles que, aprovados em concurso, estão esperando nomeação.

Sarney agride a nossa inteligência, quando diz que está sendo vítima de uma campanha da mídia, porque defende o governo Lula. Por que a mídia, então, não ataca os senadores Aloísio Mercadante e Eduardo Suplicy cujo apoio a Lula é ideológico?  Sarney pensa que as lamparinas do nosso juízo estão apagadas? Ele não é mesmo um homem comum: é um sem-vergonha. Sua imagem, projetada pela TV Senado, revela que a velhice, aqui, longe de representar sabedoria, indica senilidade, decadência, decrepitude.

Big Beautiful

Sarney é uma espécie de Belão com projeção nacional. Para quem está pegando o bonde andando, Belão é o codinome de Belarmino Lins (PMDB – vixe, vixe!), atual presidente da Assembleia Legislativa do Amazonas, que contratou por baixo dos panos 33 parentes, entre os quais a própria mãe, que mora no Ceará, dois filhos, um deles residindo em São Paulo, a mulher, todos em cargos comissionados, recebendo polpudos salários, sem trabalhar, no valor anual de R$ 1,2 milhão. Não estão ai incluídas as viagens de lazer para a família, custeadas pelos cofres públicos. Mas Belão pelo menos foi “sincero” e abriu o jogo:

 “Nunca escondi que eu tenho parentes em funções de confiança na Assembleia, porque não posso negar o que é verdadeiro. Isso é normal. Até que haja uma lei contra o nepotismo, não vou demiti-los” - disse Belão, que indagado sobre como é que sua mãe, morando em Fortaleza, podia ser assessora de bancada, ainda debochou: 

- “Dando conselhos. Mãe é pra isso mesmo”.

O resultado desses trens da alegria que circulam não apenas nas estradas federais, mas em muitas assembleias legislativas causa indignação. Um texto disseminado pela internet esclarece:

“Numa crônica intitulada O Velho Senado, escrita em 1899, Machado de Assis descreve como era o Senado do Império, em 1860, quando ele, “um adolescente espantado e curioso”, com 20 anos de idade, foi fazer a cobertura política para o Diário do Rio de Janeiro, na época, um jornal liberal, de oposição, dirigido por Saldanha Marinho e Quintino Bocaiúva. Eram senadores o Marquês de Olinda, o Visconde do Rio Branco, o Duque de Caxias e tantos outros que depois viraram nomes de ruas, praças e avenidas.

Machado registra um discurso de Eusébio de Queirós, o senador autor da lei que havia proibido em 1850 o tráfico interatlântico de escravos:

“A matéria era sobremodo ingrata: tratava-se de explicar e defender o acúmulo dos cargos públicos, acusação feita na imprensa da oposição”.

Vai ver, Eusébio de Queirós era criticado por causa do apoio ao Lula.

 

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