CRÔNICAS

O biltre escafedeu-se? Rumo eleitoral em Manaus

Em: 08 de Outubro de 1996 Visualizações: 10536
O biltre escafedeu-se? Rumo eleitoral em Manaus
A vereadora Conceição Lins (PFL - vixe! vixe!) deu dois tabefes na cara que mamãe Grazziotin beijou tantas vezes: splish, splash! O som das bofetadas na vereadora Vanessa (PCdoB) ecoou por toda Manaus. Cada um de nós sentiu o soco, como se fosse um coice na boca do próprio estômago.
Chuta a canela dela. Chuta! - gritava, possesso, o edil Roberto Alexandre (PFL, viche! viche!).
Covarde, a Câmara Municipal, em vez de punir a agressora, quase lhe dá uma medalha. Na foto do Jornal do Norte, impressionante, Ceiça Lins aparece às gargalhadas, na sessão onde foi considerada "uma heroína", escarnecendo de todos nós..
Ficamos com a face ardendo pela bolachada, entalada na garganta, esperando a hora do ajuste de contas. Chegou. No dia 3 de outubro, aconteceu o último round: eleitores deram 16.465 afagos à Vanessa, como reparação, e mandaram Ceiça Lins e Bob Alexandre para o balatal. Bem feito. Deus castiga e o eleitor vota.
Aliás, essas eleições municipais registraram novas tendências do eleitorado. Afinal, quem é mesmo esse novo eleitor baré, que está pintando no pedaço? Qual é o seu perfil? Como classificá-lo?
Um canalha! O eleitor é um ca-na-lha, concluiu candidamente Honório, um candidato inconformado.
Se "canalha vota em canalha", como sustenta Cândido Honório, então o não-canalha, o decente, vota na virtude. Ora, em Manaus, votaram cerca de 492.409 eleitores, dos quais apenas 671 optaram pelo nome imaculado do Cândido Honório. Desta forma, temos a certeza de que pelo menos 0.14% dos eleitores não é canalha. E os outros? Sobraram 491.738. Será que são todos patifes e tratantes?
Quem responde é o "Maninho" Evandro Carreira, fazendo caras, bocas e bicos:
Nem todos são canalhas. Tem muito abestalhado que também vota em canalha, porque é leso e não porque é patife.
Na lógica do "Maninho", quem não é leso, escolheu o candidato Evandro das Neves Carreira, que recebeu 0,33% dos votos, quase três vezes mais do que o Candinho, demonstrando que em Manaus, terra de Santa Etelvina, o número de não-abestalhados é maior do que o de não-canalhas.
Nada impede que um indivíduo seja ao mesmo tempo decente e leso. Ou canalha e inteligente. Pode ser que alguns não-canalhas que votaram no Candinho sejam também patetas. No entanto, os não-abestados que votaram no Evandro são todos não-canalhas, porque o "Maninho" é folclórico, mas não é velhaco. Portanto, para efeitos estatísticos, vamos considerar todos os não-abestados como não-canalhas e versa-vice. Então, diminuindo os 1.602 não-abestados do total que sobrou, ficamos ainda com a elevada soma de 490.136 eleitores, todos eles patifes ou lesos, segundo os dois candidatos citados. Será?
A candidata Irinéia Vieira discordou, depois evidentemente, de consultar suas bases:
O eleitor de Manaus é revolucionário. Vota contra a globalização, o projeto neo-liberal, Clinton, FHC e a aliança do PT e do PCdoB com setores da burguesia.
Exatamente 0,35% dos eleitores digitou, na urna eletrônica, o número 16 contra o burguês, confirmando o nome da companheira Irinéia, que daria, aliás, uma combativa vereadora. Entre esses eleitores estamos eu e minha irmã Aparecida. Ora, se restarmos os 1.713 revolucionários do que sobrou, temos ainda 488.423 eleitores. Todos eles são pústulas?
O eleitor é um equivocado, mas não é mau-caráter, choramingou Nonato Oliveira, cujos votos depositados em sua urna saíram pelo ralo, porque ela não tinha fundos. Apesar disso, cerca de 44.285 eleitores entraram no corredor psicológico do Nonato, por equívoco, e devem ser subtraídos dos 488.423. Operação feita, ficam ainda 444.138 eleitores. É gente prá dedeu. Quem são elas?

Bom, uma delas, é a Lucimar Vieira, moradora da Vila Mamão. Apaixonada, fanática, aguerrida, de uma fidelidade canina ao Boto, Lucimar pode ser acusada de tudo, menos de canalha, lesa ou equivocada. Seu lema: "vote certo no Gilberto". Ela simboliza muito bem os 25% de eleitores que são Gilberto até debaixo d'água, incluindo minha sobrinha Ana Paula. Portanto, os 125.119 votos dados ao Boto devem ser subtraídos da lista dos canalhas. Sobram ainda 319.019 eleitores.
(Nunca pensei que um dia Lucimar Mamão seria nossa companheira de luta, combatendo na mesma trincheira. Pois é, rapaz! Lucimar declarou que agora vai dedicar todas as suas energias para eleger Serafim Corrêa prefeito de Manaus. Grande Lucimar Mamão! Deus te abençôe!)
Quero cegar do sovaco se eu continuar ainda fazendo contas, com subtrações tiriricas. No entanto, temos que decidir agora o que fazer com os 319.019 eleitores, suspeitos de canalhice ou leseira amazonense. Desses, 134.475 votaram no Serafim, entre os quais o meu sobrinho Piriri, filho da Preta. São honestos, limpos e inteligentes. Ficam de fora da patifaria. Mesmo assim, continuam sobrando 184.544 eleitores. Quem são eles, na verdade? Canalhas? Abestalhados? Contra-revolucionários? Equivocados?
Excluídos os votos nulos e os brancos sobrevivem 160.163 eleitores que votaram no Cabo Pereira e 367 que votaram no Danízio. Quanto aos últimos, temos que dar mesmo razão ao "Maninho": são 367 abestalhados, um para cada dia do ano, com dois sentados no banco de reserva, acendendo vela para Santa Etelvina.
Entre os eleitores do Cabo, pode até existir alguns canalhas; afinal, eles votam neles mesmos. No entanto, a maioria é formada por gente simples, humilde, amazonense, como tu e eu, leitor (a), como o velho Raimundo, de 86 anos, do Asilo Dr. Thomas, que declarou:
- "Na última eleição fiz tanta besteira, votando no Collor, que agora não quero mais. Tenho medo de fazer besteira outra vez".
A aprendizagem no processo democrático é lenta e dolorosa, mas os eleitores de Manaus estão aprendendo a votar. Cerca de 70% dos eleitores falaram claramente: "Nós queremos mudança". O eleitor começa a rejeitar candidatos truculentos, oportunistas e carreristas que entram na política apenas "para se arrumar". Querem representantes capazes de lutar por um projeto político comunitário. A prova está não apenas em alguns nomes limpos que entraram para a Câmara, mas nos nomes sujos que ficaram de fora.
O finado senador Fábio Lucena, antes de falar, pescava palavras difíceis no dicionário. "O biltre escafedeu-se", ele disse um dia, de um adversário que fugiu do debate. "Púuuuustula", ele gritou para outro, prolongando o "pús" da primeira sílaba, que fervilhou no seu peito de fumante como se fosse um formigueiro, produzindo um chiado de bife em frigideira quente. Os biltres e pústulas estão se escafedendo. É bom sinal.

P.S. Com a morte de dona Nazaré Costa, o bairro de Aparecida perde uma de suas respeitadas moradoras. Nossos pêsames à família enlutada..

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1 Comentário(s)

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Maria Izabel Ovellar Heckmann(via FB) comentou:
03/10/2014
ótima crônica: este ponto retrata o povo atual: "eleitores falaram claramente: "nós queremos mudança". O eleitor começa a rejeitar candidatos truculentos, oportunistas e carreristas que entram na política apenas "para se arrumar". Querem representantes capazes de lutar por um projeto político comunitário. A prova está não apenas em alguns nomes limpos que entraram para a Câmara, mas nos nomes sujos que ficaram de fora."
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