- De que serve um livro sem figuras e diálogos? - pergunta Alice, logo na abertura do livro de Lewis Caroll. Alice se encontrava no País das Maravilhas. Estivesse em outro país não tão maravilhoso, a pergunta poderia ser outra:
- Para que serve um país sem livros?
Mais de 433.000 visitantes, entre os quais eu me incluo, buscaram inutilmente a resposta a essa pergunta no estande montado pelo Brasil na Feira Internacional do Livro de Bogotá (FILBO), que é, talvez, um dos eventos editoriais mais importantes da América Latina. Lá, puderam testemunhar a participação pífia - diria até vergonhosa - do nosso país. A Feira, que na versão 2013 teve Portugal como o convidado de honra, foi aberta no dia 17 de abril e fechou as portas no dia 2 de maio.
O estande montado pelo Brasil era de uma indigência absoluta: uma enorme bandeira verde-amarela com a inscrição "Ordem e Progresso" escondia apenas uma única estante com menos de 20 autores brasileiros, quase todos editados pela mexicana Fondo de Cultura Econômica - e alguns da Editorial Trotta, de Madri. Na parte posterior, havia um painel - e eu me perguntei o que é que tem a ver o cós com as calças? - onde éramos informados que "el mundo se encuentra en Brasil, com praia e mar ao fundo e um convite: "Ven a celebrar la vida". Isso era tudo. Eu disse: ISSO ERA TUDO.
Se Monteiro Lobato tem razão quando afirma que "um país se faz com homens, mulheres e livros", então a imagem do Brasil na Feira era a de um país que não existe ou que tem praia, mar, bandeira e poucos livros. Nenhum dos três itens se fez presente na Feira: nem homens, nem mulheres, e muito menos livros.
Levei quatro livros diferentes da Editora Universidade do Estado do Rio de Janeiro (EDUERJ), um deles, o belo livro de Lúcia Sá "Literaturas da floresta: textos amazônicos e cultura latino-americana". Ofereci um exemplar de cada para figurar na prateleira do estande e a responsável recusou gentilmente, alegando que havia um acordo da Embaixada do Brasil na Colômbia com a empresa Fondo de Cultura para apresentar apenas os livros publicados por essa editora ou por ela distribuídos. Só poderia abrir exceção com autorização do embaixador Antonino Mena-Gonçalves.
Os poucos livros apresentados no estande eram muito bons, mas nem de longe representavam uma amostra de nossa produção literária. Havia quatro títulos de autoria do Leonardo Boff: Ecologia, grito da Terra, grito dos pobres; Evangelho do Cristo Cósmico; A Voz do Arco Iris e o Despertar da Águia. Lá estava também o clássico Memórias Póstumas de Brás Cubas, alguns livros de Jorge Amado e de Clarice Lispector, vários de Rubem Fonseca e da presidente da Academia Brasileira de Letras, Ana Maria Machado. E se acabou. Nada mais.
Alguns amigos colombianos, que no ano passado viram o Brasil ser o convidado de honra, ficaram chocados. Havia na 26ª FILBO mais de 500 expositores, por lá circularam mais de 400 escritores colombianos e estrangeiros, lá dentro aconteceram mais de 1.500 eventos, todos eles vinculados ao livro e à leitura. Por lá passaram estudantes, professores, agentes literários, tradutores, pesquisadores, representantes de editoras, de missões comerciais e bibliotecários. Era uma ocasião importante para mostrar o que é que a baiana tem. Não mostramos.
Uma Feira Internacional de Livros como a de Bogotá, além de ser um espaço de festa e de celebração, é uma oportunidade singular para se estreitar relações culturais e editorais e cimentar laços comerciais. O Brasil ficou de fora de tudo isso.
Já o Pavilhão de Portugal parecia abrigar a produção editorial de uma potência econômica e literária, de um gigante vivo, exibindo centenas de títulos. A viúva de José Saramago, a espanhola Pilar del Rio, participou de uma mesa com a escritora colombiana Laura Restrepo.
Outro evento bastante concorrido foi a intervenção do francês Le Clézio, que viveu no México e no Panamá, e por isso é bastante fluente no idioma espanhol.
Os japoneses também se fizeram presentes como se fosse o Japão e não o Brasil, que mantivesse uma fronteira geográfica com a Colômbia. O ilustrador de livros infantis Satoshi Kitamura, bastante conhecido na América Latina, mostrou seus gatos, cachorros e outros animais, além de desenhos de Fernando, um menino muito danado. Ele manteve uma conversa com o escritor Álvaro Robledo.
O destaque foi para a exposição no espaço da Feira sobre La Cueva, um bar na cidade de Barranquila, que nos anos 1940-1950 reunia artistas, poetas, escritores, pintores, jornalistas e boêmios de todo tipo, entre os quais o escritor Gabriel Garcia Márquez. Foi uma gratificação ver crianças e jovens circularem pela exposição, não como obrigação, mas como deleite, num processo de apropriação da memória literária do país em sua língua.
No espaço da Feira aconteceu ainda o 1° Encontro Internacional de Bibliotecas Escolares e o 11° Congresso Nacional de Leitura, que tratou a biblioteca escolar como o lugar que permite a iniciação das crianças no processo de leitura e estimula a viagem pelas páginas dos livros, "conhecendo novos mundos, visitando lugares imaginados e dando vida a cada uma das palavras lidas".
No dia 2 de maio, depois do encerramento da 26a. Feira Internacional do Livro de Bogotá, os organizadores escolheram o Peru como o pais convidado de honra da próxima Feira, em 2014. Quem sabe poderemos, então, responder a pergunta de Alice e mostrar para que serve um país com livros e com leitores ativos.
Fotos: A.M. Betancurt
BRASIL: PAÍS AUSENTE DE LA 26ª FERIA
INTERNACIONAL DEL LIBRO DE BOGOTÁ
Texto: José R. Bessa Freire. Traducción: Consuelo Alfaro Lagorio
¿Para qué sirve un libro sin imágenes ni diálogos? - pregunta Alicia, justamente al inicio del libro de Lewis Caroll. Alicia se encontró en el país de las maravillas. Si estuvieras en otro país no tan maravilloso, la pregunta podría ser diferente:
- ¿Para qué sirve un país sin libros?
Más de 433.000 visitantes, entre los que me incluyo, buscamos en vano la respuesta a esta pregunta en el stand instalado por Brasil en la Feria Internacional del Libro de Bogotá (FILBO), que es, quizás, uno de los eventos editoriales más importantes de América Latina. Allí pudieron comprobar la pobre – diría incluso vergonzosa – participación de nuestro país. La Feria, que en su versión 2013 tuvo a Portugal como país invitado de honor, abrió sus puertas el 17 de abril y las cerró el 2 de mayo.
El stand instalado por Brasil era de absoluta indigencia: una enorme bandera verde-amarillo con la inscripción "Orden y Progreso" ocultaba un solo estante con menos de 20 autores brasileños, casi todos publicados por el Fondo de Cultura Económica mexicano y algunos de la Editorial Trotta, de Madrid. Detrás había un panel, y me preguntaba ¿qué tiene que ver una cosa con otra? - donde se informaba que "el mundo está en Brasil", con una playa, el mar al fondo y una invitación: Ven a celebrar la vida". Eso fue todo. Dije: ESO FUE TODO.
Si el escritor Monteiro Lobato tiene razón cuando afirma que "un país está hecho de hombres, mujeres y libros", entonces la imagen de Brasil en la Feria era la de un país que no existe o que tiene playa, mar, bandera y pocos libros. Ninguno de los tres elementos estaba presente en la Feria: ni hombres, ni mujeres, y menos aún libros.
Yo había llevado cuatro libros de la Editora Universidade do Estado do Rio de Janeiro (EDUERJ), uno de ellos, el hermoso libro de Lúcia Sá "Literaturas de la selva: textos amazónicos y cultura latinoamericana". Ofrecí al responsable de Brasil un ejemplar de cada uno para exhibirlos en el estante correspondiente , pero amablemente se negó, alegando que había un acuerdo entre la Embajada de Brasil en Colombia y la empresa Fondo de Cultura para presentar sólo los libros publicados o distribuidos por esa editorial. . Sólo podría hacerse una excepción con la autorización del Embajador Antonino Mena-Gonçalves.
Los pocos libros presentados en el stand eran excelentes, pero no representaban ni remotamente una muestra significativa de nuestra producción literaria. Fueron cuatro títulos de autoría de Leonardo Boff: Ecología, grito de la Tierra, grito de los pobres; Evangelio del Cristo Cósmico; La Voz del Arco Iris y El Despertar del Águila. También estuvieron las clásicas Memórias Póstumas de Brás Cubas, algunos libros de Jorge Amado y Clarice Lispector, varios de Rubem Fonseca y de la presidenta de la Academia Brasileña de Letras, Ana Maria Machado. Y se acabó. Nada más.
Algunos amigos colombianos, que el año anterior habían visto Brasil como país invitado de honor, no conseguían entender. Fueron más de 500 expositores en la 26ª FILBO, visitaron más de 400 escritores colombianos y extranjeros, en su interior se realizaron más de 1.500 eventos, todos ellos vinculados al libro y la lectura. Por allí pasaron estudiantes, profesores, agentes literarios, traductores, investigadores, representantes de editoriales, misiones comerciales y bibliotecarios. Fue una ocasión importante para mostrar lo mejor de Brasil. No lo mostramos.
Una Feria Internacional del Libro como la de Bogotá, además de ser un espacio de fiesta y celebración, es una oportunidad única para fortalecer relaciones culturales, editoriales y cimentar vínculos comerciales. Brasil quedó fuera de todo esto.
El Pabellón de Portugal parecía albergar la producción editorial de una potencia económica y literaria, un gigante viviente, que exhibía cientos de títulos. La viuda de José Saramago, la española Pilar del Río, participó de un panel con la escritora colombiana Laura Restrepo.
Otro evento muy concurrido fue la intervención del francés Le Clézio, que vivió en México y Panamá, por lo que era fluente en español.
Los japoneses también estuvieron presentes como si fuera Japón y no Brasil, que mantenía una frontera geográfica con Colombia. El ilustrador de libros infantiles Satoshi Kitamura, muy conocido en Latinoamérica, mostró sus gatos, perros y otros animales, además de dibujos de Fernando, un niño muy travieso. Mantuvo un diálogo con el escritor Álvaro Robledo.
Lo más destacado fue la exposición en el espacio de la Feria sobre La Cueva, un bar de la ciudad de Barranquilla, que en las décadas de 1940-1950 reunió a artistas, poetas, escritores, pintores, periodistas y bohemios de todo tipo, entre ellos el escritor Gabriel García Márquez. Fue gratificante ver niños y jóvenes recorrer la exposición, no como una obligación, sino como un deleite, en un proceso de apropiación de la memoria literaria del país en su lengua.
En la Feria también tuvo lugar el I Encuentro Internacional de Bibliotecas Escolares y el XI Congreso Nacional de Lectura, que trató la biblioteca escolar como un lugar que permite a los niños iniciarse en el proceso lector y les anima a viajar a través de las páginas de los libros, "descubriendo nuevas mundos, visitando lugares imaginados y dando vida a cada palabra leída."
El 2 de mayo, al final de la 26ª Feria Internacional del Libro de Bogotá, los organizadores eligieron a Perú como país invitado de honor en la próxima Feria, en 2014. Quién sabe, entonces podremos responder la pregunta de Alicia y mostrar para qué sirve un país con libros y lectores activos.
Fotos: A. M. Betancurt