CRÔNICAS

Custódio, que nome tens tu? A troca de nomes

Custódio, que nome tens tu? A troca de nomes

. Começa por uma flor / o nome do marechal / Mas o nome do Almirante / principia muito mal (Artur Azevedo, 1894)

Durante a Revolta da Armada (1891-1894), a briga feia entre o marechal Floriano Peixoto e o Almirante Custódio de Mello, fizeram com que seus respectivos nomes de batismo fossem questionados em versos. O nome de uma pessoa talvez decida sobre seu destino. Você, eleitor (a), votaria em alguém com o nome de Theofilina, candidata a deputada pelo Amazonas?

Alguns pais decidem avacalhar o nome dos filhos, caso da Theofilina. Já o escritor Oswald de Andrade, no lugar de nome de seres humanos, se inspirou em heróis míticos indígenas e registrou um de seus pimpolhos, que devia se chamar Rolando, com o nome de Rudá Poronominare Galvão de Andrade, que dirige hoje a Cinemateca de São Paulo.

- Reza a lenda - conta o crítico literário Antônio Cândido - que Oswald, anarquista, boêmio e gozador, queria mesmo batizar Rudá como Rolando, mas Rolando Escada Abaixo de Andrade, assim como o outro filho era chamado informalmente com o apelido de Lança-Perfume Rodometálico de Andrade.

Na semana passada, compartilhamos juntos o receituário para extirpar os nomes feios da família amazonense. Se seus pais não seguiram as cinco regras lá anunciadas, então aplique a regra 6, que diz:

- Troque de nome (Se possível, também de domicílio eleitoral). Faça como o Sarney, ex Ribamar. Ou a Theofilina, que se recusou a registrar-se no Tribunal Regional Eleitoral com esse nome de supositório contra a asma e trocou por outro mais viável eleitoralmente.

A regra 6 pode ter um enunciado simples, mas sua operacionalização é trabalhosa, requer complexos trâmites burocráticos e desvios de personalidade como podem atestar, entre outros, Antônio Teffé, Chiquinha Bessa, Ronnie Von, Chico Chatô, Raimunda Nonata, Prodamor e este locutor aqui que vos fala…

Prodamor

Alguns obstáculos legais se interpõem no caminho de quem quer trocar de nome.

Por isso, o deputado federal Áureo Mello, nascido em Rondônia, apresentou um projeto de lei, em 1965, que proibia “o registro de nomes ridículos ou humilhantes”. Não sei se já pensava nos nomes de Theofilina e Amazonino, mas na sua justificativa citou nomes que pesquisou nos cartórios como Sandália de Oliveira, Esparadrapo da Silva, Eduardo Lembrança do Aliás, Creolina Cruzvaldina dos Santos, o manjado Um Dois Três de Oliveira Quatro e o clássico Prodamor.

Seu nome completo é Prodamor Conjugal de Marimá e Marichá, nascido em Caruaru, legítimo “Produto do amor conjugal de Maria Madalena e Mário Chaves”.

O pernambucano Prodamor não mudou logo de nome, porque em junho de 1965, outro pernambucano, o padre e deputado Arruda Câmara, que era o relator na Comissão de Constituição e Justiça, deu um parecer contrário, derrubando o projeto de Áureo Mello por considerá-lo "absolutamente irrelevante”. Mandou um recado mais ou menos assim: “Áureo, vai te ocupar de coisas sérias”.

No seu delicioso livro Os Bucheiros, outro Áureo, o Nonato, se ocupa de coisas sérias como a história da Chiquinha Bessa, filha do tio Josué, um barbeiro lá do bairro de São Raimundo. Ela era “uma encantadora moça, bela, elegante e muito vaidosa”, que brincava na sua infância de “manjalé-toma-chicra-de-café” com o Áureo, em frente à sede do Sulamérica Futebol Clube. De médico não, que ela era decente, apesar da insistência do Áureo.

A brejeira Chiquinha casou, mudou para o Rio de Janeiro e trocou de nome, na marra, passando a se chamar “Francis”. Segundo o Áureo, a prima trocou também de personalidade:

- Ai daquele que a chamasse de Francisca ou Francisquinha e pior ainda, de Chica. Também não era mais amazonense nem do bairro dos Bucheiros. Tornou-se carioca.

Que metamorfose pai d´égua. Estou tentando mudar de nome, como veremos adiante, mas jamais renegaria o meu Beco da Bosta, o meu berço do bairro de Aparecida. NUNCA. Never – como dira a Francis. (Sentiu firmeza, leitora?).

Nonata

No entanto, não condeno a alienação da prima, quando um Chico, de Umbuzeiro, na Paraíba, também trocou de nome e ficou famoso. Francisco de Assis Bandeira de Mello, já grandinho, insatisfeito com o vulgar apelido de Chico, se invocou e introduziu um Chateaubriand no seu nome, tornou-se imperador dos Diários Associados e os seus filhos – todos – herdaram o nome francês de Chateaubriand.

Você sabe qual o nome escolhido pela Theofilina? E o nome de batismo da manequim negra, Luana, que conquistou a Europa e ficou famosa? Pois bem, na certidão de nascimento dela está escrito: Simona Raimunda Nonata do Sacramento.

Uma análise cuidadosa da troca de nomes me permitiu descobrir que o caminho do sucesso é escolher o inglês, como a Francis Chiquinha ou o francês como o Chico Chatô. O famoso cantor e pianista Dick Farney foi batizado como Farnésio Dutra e o Ronaldo Nogueira passou a assinar Ronnie Von, nome pelo qual até hoje é conhecido.

Quem seguiu este conselho e se deu bem foi o amazonense Toinho Teffé e se deu bem. Bisneto do Barão de Teffé, viajou para a Itália. Boa pinta, ficou sem grana. Ator, mas desempregado. Batalhava uma ponta num filme daqueles “western-spaghetti” e fez um teste. O entrevistador perguntou:

- Nome?

E o lesão respondeu:

- Antônio Madeira de Teffé, com dois ff para indicar a nobreza.

- Negativo, no momento nós não temos vagas – disse o responsável pela seleção.

Bastou o Toinho seguir a regra 6 e americanizar-se, adotando o nome de Anthony Steffen, que tudo mudou como num passe de mágica, as portas da Cinecittá se abriram para ele. De Leve. Os cães ladram e a caravana passa.

Gil Igarapé

Depois do sucesso do Toinho, traduzi para o inglês e o francês o meu nome Ribamar maculado pelo Sarney. A leitora agora pode escolher qual dos dois é o mais chic para figurar no alto dessa coluna: Joseph Oversea Very Much, que tem uma forte carga de credibilidade ou Joseph Sur Mer Davantage, que é mais romântico (Davantage soa mais nobre que beaucoup, ainda que ambos acabem dizendo a mesma coisa: muito, à bessa).

Já o Amazonino conhecido como Nininho é teimoso, morre de vergonha, mas não quer trocar, pensando que pode conservar a única vantagem que o nome geográfico lhe conferia na escola primária de Eirunepé: ser o primeiro da lista de chamada em ordem alfabética. Mas você, (e) leitor (a), pode trocar nas urnas, marcando um “x” em outro nome. Nas urnas, nem todos os gatos são pardos.

Os políticos, quando insatisfeitos com os próprios nomes, preferem adotar o modelo romano. O costume na Antiga Roma, era manter o nome, acrescentando a ele um cognome ou alcunha, que recordava os feitos militares ou as grandes obras. Públio Cornélio Cipião, por exempoo,ficou conhecido como Cipião Africano pelas suas vitórias sobre os cartagineses no Norte da África.

No Amazonas, após a Batalha do Igarapé de Manaus, quando professores e jornalistas foram violentamente espancados, o “general” autor da façanha seria chamado de Gilberto Igarapé. Outros seguiram o exemplo: Amazonino Penicão, De Carli Catitão, Manuel Ribeiro Pracinha, etc todos eles incorporariam os grandes feitos aos respectivos nomes, inclusive Mário Frota Amigo da Aninha Aciolly.

Mas o novo nome não pega, se não insistir, como fez aquele cearense citado por Gustavo Barroso em O Sertão e o Mundo. Ele queria dar à filha o nome de Onça, assim como a Juma Marruá. O padre se recusou a batizar se não fosse com o nome cristão e não de bicho. O pai da menina argumentou:

- Se o Papa se chama Leão, por que minha filha não pode ser batizada como Onça?

Custódio

Troque seu nome, mas cuidado. Cui-da-di-nho com cada sílaba para impedir a gozação dos engraçadinhos. No final do século passado, o marechal Floriano era o presidente da República e seu ex-ministro Custódio de Mello tentou derrubá-lo na Revolta da Armada. Então, o poeta maranhense Artur Azevedo fez a seguinte quadrinha:

Começa por uma flor / o nome do marechal / Mas o nome do Almirante / principia muito mal

A galera do almirante respondeu:

Floriano, Floriano, / Começa cheirando / e termina fedendo

A resposta veio na hora:

Custódio, Custódio / Que nome tens tu / Termina com ódio / e começa assim.

P.S. - Correspondência com a coluna: Ribamar Bessa, Avenida Graça Aranha, 174, Grupo 509. CEP 20.030. Rio de Janeiro - RJ

Ver também: De nomes feios e palavrões - https://www.taquiprati.com.br/cronica/632-de-nomes-feios-e-palavroes

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